Desde que me conheço, e já lá vão uns bons aninhos, que sempre ouvi dizer que Guimarães é má mãe e boa madrasta.
Um adágio antigo, que tanto quanto sei vem de tempos imemoriais, e que
quer significar que em Guimarães mais depressa se dá valor, reconhecimento,
mérito a quem vem de fora do que aos filhos da Terra que esses tem de fazer
sempre muito mais e muito melhor que os forasteiros para obterem o merecido
reconhecimento.
É sina nossa.
Sina que se aplica às mais diversas áreas da comunidade vimaranense,
da política ao desporto, da cultura ao associativismo, da educação ao
jornalismo e por aí fora que exemplos na matéria é algo de que não existe
qualquer tipo de carência.
Na política, por exemplo, e sem pôr minimamente em causa os méritos de
quem inegavelmente os tem os vimaranenses demonstraram muito mais apreço pelo
presidente de câmara António Magalhães, nascido em Cabeceiras de Basto (mas
radicado em Guimarães há tantos anos que já se pode considerar um vimaranense),
do que pelo presidente de câmara António Xavier nado e criado em S.Torcato e
que sendo dos vimaranenses mais notáveis do seu tempo, com obra e participação
em áreas tão diversas como a política,a acção social, o desporto entre outras,
não mereceu dos eleitores o reconhecimento dos seus méritos e da sua visão para
o concelho.
Outros exemplos poderiam ser dados, noutras áreas, mas estamos em
tempo em que o futebol domina, por força do Mundial russo, e por isso de
futebol se falará no restante artigo.
De futebol na vertente “mãe e madrasta” é claro.
Porque há algo em que o “mãe e madrasta” se aplica de forma tão total
quanto injusta (injustíssima às vezes) é aos jogadores formados no Vitória que
sendo vimaranenses de nascimento e vitorianos de coração tem uma bitola de
apreciação por parte de muitos adeptos que raia o absurdo em termos de
exigência perante as suas prestações quase se exigindo que cada um deles seja
um Ronaldo ou um Messi para merecer aplauso.
Ao contrário do que acontece com muitos jogadores vindo de fora que ao
segundo pontapé bem aplicado na bola viram ídolos aos quais tudo se aceita,
tudo se compreende, tudo se perdoa mesmo que desrespeitem a camisola do clube
como nalguns casos conhecidos.
Aos da Terra é que não.
Talvez por isso tendo o Vitória reconhecidamente excelente formação
nos escalões mais jovens, desde pelo menos o saudoso Augusto Barreira na sua
oficina da Amorosa, são muito poucos os jovens que conseguiram subir à primeira
equipa e nela se afirmarem como titulares
durante um razoável período de tempo.
Se fizermos um esforço de memória recordaremos , nos últimos cinquenta
anos, uma dúzia de nomes nessas condições: Abreu, Romeu, Ibraim , Costeado,
Miguel, Carvalho, Laureta, Pedro Mendes, Fernando Meira, Targino, Agostinho,
Quim Berto e poucos mais(e alguns deles tiveram de sair para rodar antes de
regressarem e se fixarem na equipa) a atestarem bem as dificuldades de os
jovens da formação se imporem.
Em 2012 /2013 com a criação da equipa B, como última etapa do processo
de formação e primeiro passo no profissionalismo, tentou-se com algum sucesso
inverter esse paradigma fazendo a equipa A beneficiar do trabalho dos escalões
de formação.
E conseguiu-se.
Nomeadamente vencendo a Taça de Portugal com vários titulares que
tinham começado a época na equipa B (e feito a formação no clube) como foram os
casos de Ricardo Pereira, Paulo Oliveira e Tiago Rodrigues num plantel sem
jogadores emprestados.
A partir de então começou a haver mais espaço na equipa principal para
os jovens vindos da formação embora com o ónus daqueles que se afirmavam serem
rapidamente vendidos não permanecendo no clube o tempo suficiente para o clube
poder beneficiar do seu desempenho desportivo.
Paulo Oliveira, Ricardo Pereira e Tiago Rodrigues já citados mas
também Cafu ,João Pedro e Josué entre outros.
Mas se as oportunidades aumentaram o “mãe e madrasta” de alguns
adeptos não diminuiu e bastará atentar nas redes sociais para perceber que o
grau de exigência para os da casa continua a ser muito maior do que para
aqueles que vem de fora sendo Miguel
Silva na actualidade o melhor(pior) exemplo disso.
Curiosamente o “mãe e madrasta” também alastrou a alguns técnicos do
clube.
E por isso há jogadores feitos na casa, vimaranenses e vitorianos, que
tiveram de ir mostrar o seu talento para outros lados porque no Vitória também
os seus treinadores tinham para com eles uma bitola de apreciação muito
rigorosa em relação a outros colegas.
Exemplos ao longo dos anos?
Tantos que seria fastidioso recordá-los a todos.
Mas cito Tomané, que esta época fez nove golos pelo Tondela, enquanto
nós nos desesperávamos com Tallo, Rincon, Sturgeon e afins e que é um exemplo
de um jogador desperdiçado pelo clube de forma incompreensível.
Mas também podia falar de João Amorim, de Pedro Lemos, de Luís Rocha
entre outros.
Vem toda esta reflexão a propósito da carta de despedida que Rui Areias
publicou nas redes sociais a despedir-se do Vitória, agora que vai continuar a
sua carreira no Penafiel, e que me impressionou pelo seu conteúdo.
O Vitória ao longo dos anos , desde a tal oficina da Amorosa,formou
excelentes jogadores em todas as posições mas nunca formou um grande ponta de
lança que nos desse as alegrias que nos deram Mendes, Jeremias, Cascavel,
Saganowski,etc.
Podia ter sido Artur Jorge mas não teve oportunidades (outros
tempos...) e fez uma bela carreira a marcar golos em todo o lado menos no
Vitória.
Podia ter sido Armando...mas não foi.
Podia ter sido Tomané mas também não foi porque hoje é muito mais um
extremo ou um segundo avançado do que um homem de área para além de não jogar
no clube.
Mas aquele que conheço desde menino da formação e que sempre pensei
que seria o “tal” (não confundir com Tallo...) esse era Rui Areias cujo talento
inato para jogar na área é garantia de golos.
Acompanhei a sua etapa na equipa B, que integrou no ano inicial de
2012/2013, e pelo que fui vendo reforcei essa convicção de que seria o grande goleador
formado no clube e que nos iria dar golos e alegrias numa primeira fase e
depois uma grande transferência.
Num campeonato difícil como a II liga marcou apenas dois golos no ano
de estreia, mas estava longe de ser primeira opção como ponta de lança, mas a
seguir encarreirou marcando 11, 14 e 9 golos nas três épocas seguintes sempre
acompanhados de uma completa falta de oportunidades para jogar na equipa A
porque os golos que marcava na B não impressionavam os treinadores da A.
“Mãe e madrasta” no seu estado puro.
Em 2016/2017 foi estranhamente emprestado ao Porto B onde fez sete golos mas nem isso foi
suficiente para ter uma oportunidade no Vitória sendo na época passada cedido
ao Arouca onde fez uma época discreta num clube que também não alcançou os
objectivos de subida.
Esta época nem oportunidade lhe foi dada para fazer a pré temporada e sai
a caminho do Penafiel ,candidato à subida, despedindo-se com a tal profissão de
amor a Guimarães e ao Vitória que me impressionou e me levou a esta já longa reflexão
sobre como Guimarães (e às vezes o Vitória) são tão hospitaleiros, tolerantes e
compreensivos com quem vem de fora e tão absurdamente exigentes com quem é de
cá.
E apesar de todos perdermos, desde sempre, com essa mentalidade não há
forma de muitos aprenderem e mudarem de atitude!
1 comentário:
Os sócios assim quiseram. Viva a esta direção e aos Tallos que temos.H.M.
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