É um exercício curioso reflectirmos sobre o que significa hoje ser
militante de um partido político e, muito especialmente, de um grande partido
como o PSD ou o PS que são aqueles que podem aspirar à liderança de um governo.
Depois, se formos para o plano autárquico, teremos de incluir nesse
lote o PCP e o CDS também eles partidos que lideram autarquias embora em número
consideravelmente inferior aos outros dois.
A minha experiência de militância é antiga, muito antiga mesmo pelos
padrões democráticos do pós 25 de Abril, porque me filiei na JSD em Janeiro de
1975 e portanto tenho uma ligação umbilical ao PSD que já vai em quarenta e
dois anos.
Que não é a mesma coisa que 42 dias, semanas ou meses!
E por isso consigo fazer uma comparação entre esses tempos e os
actuais, entre o que era militar num partido logo a seguir à instauração da
democracia com todo o entusiasmo acarretado por essa experiência nova de viver
em liberdade e o que é viver numa democracia consolidada em que muitos dos que
ocupam cargos dirigentes já nasceram depois da revolução.
E não só não tem a experiência desses tempos como tão pouco fazem a
mínima ideia do que custou construir e consolidar partidos democráticos nos
tempos tão difíceis do PREC em que ser social-democrata (especialmente) ou
socialista acarretava a intolerância, a incompreensão e até perseguições de uma
certa esquerda que se julgava proprietária do 25 de Abril e dava o Portugal de
então numa via irreversível para o socialismo não democrático segundo modelos
importados das ditaduras do Leste europeu.
Sem saudosismos desajustados mas com a memória suficiente a perceber a
importância das coisas tenho a noção clara que a construção dos partidos (até
do próprio PS cuja fundação remontava a 1973) se fez um pouco por todo o lado
apostando em cada concelho nas personalidades de relevo local por via da sua
ascendência profissional, das famílias de que eram oriundos, do não
comprometimento com o regime deposto e pela participação no movimento
associativo local quer em termos culturais quer até desportivos.
E por isso, qual “caça ao troféu”, quem num determinado concelho
conseguisse levar para o seu partido as personalidades mais influentes tinha
meio caminho andado para a implantação concelhia do seu partido ser um sucesso
e poder aspirar à liderança da respectiva autarquia quando se realizassem
eleições para o poder local.
Foi assim que PSD, PS e CDS (o PCP, como é sabido, já existia desde há
muitos e muitos anos) se implantaram, cresceram e definiram o peso político que
ainda hoje tem e que em termos de eleitorado “fiel” é sensivelmente o mesmo
variando depois aquele eleitorado “flutuante” que em cada eleição dá a vitória
a uns e a derrota a outros.
Claro que em 40 anos muita coisa mudou.
Aparecerem e desapareceram partidos, houve fenómenos eleitorais
efémeros como o PRD ou mais duradouros como o BE, houve um partido (PCP) que se
aguentou face ao desaparecimento do seu modelo de sociedade e conseguiu
estabilizar o seu eleitorado e outro (CDS) que atravessou períodos difíceis de
quase nula influência politica mas que recuperou por força de uma liderança que
durou mais de uma década e que cessou o ano passado.
Claro que o passar dos tempos também teve uma influência grande na
orgânica de PSD e PS em especial como grandes partidos do regime.
Passou-se do tempo das adesões por ideologia (que ainda existem mas
são menos em termos de expressão) para o tempo da filiação por arrastamento
(muito por influências das Jotas), das adesões por interesses relacionados com
o poder que os partidos tem para distribuir, para as filiações por interesses e
não por convicções.
O que, entre outros efeitos, teve a perniciosa consequência de os
partidos verem afastar-se pessoas que neles militavam por ideias e convicções,
mas que estavam cada vez menos para conviver e suportar realidades internas que
passavam pelo voto organizado em autênticos “sindicatos”, pela perpetuação no
poder de quem controlava esses votos e por uma cada vez menor democraticidade
interna que tinha a sua maior expressão na falta de debate interno, de
confronto de opiniões e de respeito pelas funções dos órgãos sendo tudo isso
substituído pela vontade imperativa dos “chefes”.
Isto a par do surgimento nos partidos de uma geração de “cristãos
novos”, ansiosos por demonstrarem a sua “fé”, e que atropelam tudo e todos na
ânsia de conquistarem o poder interno para depois o transformarem em poder
externo e poderem ocupar lugares em câmaras municipais e listas de deputados
entre outros.
Devo dizer que tendo uma visão negativa sobre o que tem sido a
“evolução” dos partidos e uma visão “crua” sobre os riscos que os ameaçam
continuo a acreditar num sistema de partidos e a defender que são eles as
traves mestras da vida democrática à qual são indispensáveis.
E por isso continuo, 42 anos depois, militante do PSD.
Mas consciente da desilusão dos cidadãos com a política e com os
partidos, preocupado com a cada vez maior atracção que se nota na sociedade
para soluções mais radicais, certo de que o descrédito que os partidos
actualmente atravessam vai potenciar cada vez mais a aposta em candidaturas
“independentes” (veja-se as próximas autárquicas) que são elas mesmo um
fenómeno de perigoso populismo.
Creio que os partidos devem fazer um sério esforço de introspecção.
Olharem para dentro, analisarem os erros, procurarem novas formas de
atractividade para os cidadãos, regenerarem alguns procedimentos e práticas
como condição de continuarem a ser o centro e o suporte da vida política
democrática.
Até porque as “alternativas” não são…alternativa!
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