sábado, abril 10, 2021

The Birds

É raro, mas acontece, publicar neste blogue textos colhidos nas redes sociais ou noutros blogues.
Mas quando gosto do que li e acho que merece divulgação faço-o com todo o gosto.
É o caso deste texto e cartoon do Miguel Salazar que acho absolutamente excepcionais na qualidade artística do desenho e no humor que reveste todo o texto.
Aí fica.
Depois Falamos.

“The Birds”, de Miguel Salazar (2)

(d’après Alfred Hitchcock)
OS ABUTRES QUE SABIAM SER ABUTRES...
- Como é que é, Chefe? Vamos comer aquela carniça?
- Qual carniça, pá? Aquela que está ali em baixo, na capoeira daquele pintaínho?
O abutre maior apontava para o guerreiro que ali jazia deitado, na capoeira do sopé da Colina Sagrada. Ao fazê-lo mostrava dois “pins” reluzentes, no lado de dentro da sua asa. Intrigado, o abutre mais pequeno perguntou...
- Oh Chefe, esse “pin” que traz aí ao lado do de prata do Vitória, é o de diamante do Leiria?
- Pois claro. 75 anos de sócio!
- Oh Chefe, mas o Leiria só tem 54! E o Chefe... 57...
- Oh, carago!... Agora é que me lixaste.
- Pois, se calhar desta vez exagerou um bocadinho, não, Chefe?...
Não durou muito, porém, a preocupação do abutre maior acerca dos “pins” que ostentava. Aquilo que realmente lhe importava, era saber se já tinham carniça para comer, ou se, ao invés, o guerreiro estava apenas a dormir.
- Olha que eu não sei se o Afonso está moribundo. Se calhar está só a descansar. E nós somos abutres, pá. Não somos águias nem falcões.
- Tem de estar moribundo, Chefe. Da maneira que o deixamos há 2 anos, só pode estar. E aquela carniça tem mesmo bom aspecto. Parece podre, não parece? Nham, nham... E só tem aquele pintaínho ali a guardá-lo...
- Não sei, pá. A mim o pintaínho não me preocupa, mas tu já viste bem o elmo e aquela cota de malha? Como é que vamos conseguir chegar á xixa? E o tamanho da espada do gajo? Ainda ficamos sem cabeça, pá. Se calhar é melhor esperar mais um bocado.
- Precisávamos de arranjar um predador a sério, Chefe. Um daqueles que arrisca a vida, para ir lá fazer o serviço por nós, não acha?
- Pois. E assim, se corresse mal, o gajo é que se lixava...
- Deixe-me lá ver na minha lista de contactos... Olhe, tenho aqui o telefone do chacal, do corvo... da hiena... do urubu...
- Eh pá! Não, pá! Esses são como nós. Precisávamos era de um leão... ou de um tigre... De um predador a sério, ‘tás a ver? Procura lá bem...
- Ui, desses não tenho. Nós não nos damos com essa gente do “jet set”, Chefe. Nós é mais com necrófagos... também tenho aqui uma barata, um corvo... Olhe, Chefe... tenho aqui um papagaio! Este também é uma espécie de necrófago... à sua maneira, claro. Pensa que é um mocho, mas deve servir... Vai papaguear tudo o que lhe mandarmos...
- Boa. Então liga-lhe e faz a encomenda.
- Se calhar é melhor não, Chefe. Pode ter o telefone sob escuta.
- E depois? Nesta selva, as escutas nunca dão em nada.
- Pois... Mas, ainda assim, eu prefiro mandar por correio. Assim ninguém desconfia...
Miguel Salazar

Sem comentários: