Eu conheço-os.
E estou em crer que todos os leitores desta linha também os conhecem.
São cidadãos das mais diversas idades e profissões, oriundos dos mais
diversos meios sociais, de diferentes convicções políticas e religiosas e com
percursos de vida variados e multifacetados nos seus mais diversos aspectos.
Tem , contudo, características que os unem e tornam mais iguais do que
muitos deles,por outras razões, gostariam de admitir.
E são, na sua esmagadora maioria, boas características diga- se de passagem.
Gente honrada, trabalhadora e estruturalmente séria.
Nas suas vidas familiares, nas suas vidas profissionais, nas suas
relações com colegas e amigos são pessoas de carácter, com valores, que prezam
a honestidade e praticam a lealdade nos procedimentos e nas atitudes.
Gente boa em suma.
Mas depois, no melhor pano cai a nódoa, vem a tal característica que
também os iguala mas que em muitos casos não gostam de admitir.
O clubismo cego, tribal, de antagonismo feroz e combate sem quartel.
Que com a maior facilidade deste mundo português transforma um desses
pacatos e exemplares cidadãos atrás descritos num autêntico gladiador que em
nome da bandeira do seu clube é capaz das maiores tropelias intelectuais
negando no desporto o que defende na Vida e consagrando o “vale tudo” como
instrumento importante nos triunfos do seu clube.
Compreendo, quem não compreende, que numa vida agitada como a dos
tempos de hoje em que o imediatismo é regra, a sobrevivência uma dura
competição e o triunfo a panaceia para quase todos os males a válvula de escape
constituída pelo triunfo do seu clube é algo de irresistível e que justifica o
fechar de olhos aquilo que se condena na prática diária de vida.
E por isso importa é ganhar.
Ganhar sempre. Como pouco importa desde que se ganhe.
Creio que não é preciso procurarmos muito para encontrarmos à nossa
volta tristes exemplos do que acabo de escrever bem como ver escarrapachados na
comunicação social esses exemplos de tribalismo clubista que vão dando ao
desporto, mas ao futebol muito em particular, essa aura de indesejabilidade
crescente.
Quem vir alguns artigos de opinião nos jornais, debates televisivos
diários de representantes de três clubes, as redes sociais em que muitos fazem
das páginas alheias a sua própria “sala de visitas” ou os comentários deixados
nas páginas on line dos mais diversos sites perceberão bem o que está atrás
escrito sobre a transmutação de gente equilibrada na Vida em autênticos
gladiadores no desporto.
É um fenómeno, triste fenómeno aliás, transversal a idades,culturas,
educações, sexo ou profissões
E clubes também.
Embora seja claramente um fenómeno muito mais frequente em adeptos do
Benfica, Porto e Sporting por razões que a estatística e a História do nosso
futebol bem explicam e que portanto é desnecessário estar aqui e agora a
esmiuçar.
Mas a que acrescento outra, porventura mais importante que a
Estatística e a História, e que é o permanente mau exemplo dado por quem dirige
esses clubes e que alheando-se completamente das responsabilidades pedagógicas
de dirigir quase fazem questão de estar sempre na primeira linha do confronto
insensato e do tribalismo clubista.
Quando num clube sobre o qual pairam imensas suspeitas a resposta é
criar gabinetes de crise para melhor resistir às investigações do que assumir
responsabilidade e contribuir para o apuramento da verdade que se pode pensar do exemplo dado?
Ou quando noutro a má criação do treinador,deixando colega de
profissão de mão estendida, em vez de merecer a severa censura de quem dirige
ainda provoca elogios como sendo uma justa manifestação de inconformismo
perante a estratégia de jogo do adversário que se pode dizer sobre semelhante
mentalidade?
Ou ainda num terceiro clube quando a doutrina oficial passou a ser o
culto da personalidade do presidente ao abrigo da qual se insultam adversários,
se expulsam vozes incómodas e se pretende reescrever a História do clube como
se pode querer que os adeptos encontrem nisso a motivação para comportamentos
exemplares?
A natureza humana, já todos os sabemos, é complexa.
Em Portugal, face à forma tribalista como se dirigem os principais clubes
baseada no velho axioma salazarista de que “quem não é por nós é contra nós”e
reforçada pela insistência de ver em cada adversário um perigoso inimigo, ainda
mais complexa se torna.
Rumo à desgraça que um destes dias, ,mais próximo do que longínquo,
vai acontecer num estádio ou nas suas imediações.
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