segunda-feira, outubro 15, 2018

A Taça

O meu artigo desta semana no zerozero.

Não há no futebol português nenhuma prova que tenha a amplitude geográfica e afectiva, porque nela participam equipas de todo o país, da Taça de Portugal.
De Norte a Sul, de Este a Oeste, nos dezoito distritos do continente e nas regiões autónomas há equipas a participarem na prova, a sentirem o seu sortilégio, a sonharem com a presença na final do Jamor para inscreverem o seu nome na História do nosso futebol.
É certo que só duas lá chegam, e algumas por repetidas vezes, mas enquanto há vida há esperança e por isso até os clubes mais modestos quando iniciam a sua participação na Taça fazem-no com a expectativa de conseguirem chegar ao jogo derradeiro ou então, o que é apesar de tudo menos improvável, conseguirem encontrar-se pelo caminho com uma equipa da primeira liga e se possível uma daquelas que como Benfica, Porto, Sporting ou Vitória Sport Clube garantem receita de boa dimensão.
Já por diversas vezes ao longo dos anos, e algumas aqui no zerozero, tenho manifestado a minha frontal discordância com o facto de a final se disputar no Jamor que considero um estádio sem condições para um jogo dessa envergadura por mais que o folclore dos piqueniques na mata, o ar helénico das bancadas e a tradição sirvam para a defesa desse palco para esse jogo.
Quem tiver assistido lá à final de 2017 entre Vitória e Benfica perceberá bem o que estou a dizer.
Mas o tema que hoje quero abordar não se prende com o estádio em que se joga a final mas sim com os vários jogos em que se deviam disputar jogos da taça e não se disputam face à realidade mentirosa do nosso futebol.
Um dos sortilégios que sempre contribuiu para a popularidade da Taça de Portugal foi o facto de ela proporcionar a visita ao interior do país, normalmente arredado da primeira liga, das equipas que as populações dessas zonas normalmente só veem através da televisão e que apenas na Taça tem a possibilidade de ver ao vivo.
O que somado à possibilidade de o clube mais fraco  a jogar em casa, num recinto a que já está habituado e com apoio do seu público, se tornar num “tomba gigantes” acresce uma substancial dose de mística à prova.
Mas estamos em Portugal.
E por isso ao contrário do futebol verdadeiro, o que se disputa em países como Inglaterra, Espanha,Alemanha, Itália ,etc, onde essas manobras seriam impossíveis, no Portugal actual (dantes não era assim) mal algumas equipas sabem o seu destino ou seja a casa do “pequeno” a que se deslocam começam logo a arranjar pretextos para levarem o jogo para outro campo que lhes seja mais propício.
Ou é o relvado que não serve, ou os balneários que não tem condições, ou as bancadas possuem pouca lotação, ou não há condições para a transmissão televisiva, ou qualquer outro pretexto que lhes permita transformar um jogo com algum grau de dificuldade num passeio agradável e pouco cansativo.
Normalmente os interpretes destas manobras são Benfica,Porto e Sporting.
Que com essas manobras, em que às vezes se insere a oferta ao anfitrião da totalidade da receita, conseguem deturpar por completo a verdade desportiva da competição transformando-a numa prova em que há filhos e há enteados.
Como em todas as outras aliás.
Veja-se a titulo de uma das centenas de exemplos possíveis ao longo dos últimos trinta anos o que se vai passar no próximo fim de semana.
Enquanto o Vitória vai ao campo do Valenciano, o Braga ao do Felgueiras, o Nacional ao do Lusitano de Vildemoinhos, o Moreirense ao do S. Martinho, o Chaves ao do Pedras Salgadas, o Vitória Futebol Clube ao do Armacenenses, o Marítimo ao do Moura, o Feirense ao do Mirandela e até o Porto ao do Vila Real  (este ano não terão conseguido deslocar o jogo para outro lado), entre outros exemplos possíveis o que acontece com Benfica e Sporting?
O Benfica em vez de ir à Sertã, como aconteceu por exemplo com o Porto em duas ocasiões, conseguiu desviar o jogo para o estádio Cidade de Coimbra com o pretexto de que o relvado do Sertanense não estava em condições e tem um jogo europeu na semana seguinte.
O Sporting em vez de ir a Loures jogará noutro estádio (à hora a que escrevo ainda não se sabe qual) em que as dificuldades serão presumivelmente menores com o argumento da lotação e da iluminação serem insuficientes.
Claro que os dirigentes dos visitados são seduzidos por receitas muito maiores (e com a tal nuance de às vezes até poderem ficar com a totalidade) e anuem à pretensão dos visitantes fazendo tábua rasa do interesse dos seus adeptos que apoiando as suas equipa ao logo de toda o ano bem gostariam de ter esses jogos nos palcos habituais.
Há que dizer que isto não é sério, não respeita a verdade desportiva, não defende os interesses do futebol.
E é pena que ninguém queira tomar medidas para acabar de uma vez por todas com esta autêntica pouca vergonha que transforma uma prova fantástica como a Taça de Portugal num arranjinho para favorecer alguns no percurso para o Jamor.
Mas estamos em Portugal.
E o futebol português é isto!

4 comentários:

luso disse...

Completamente de acordo
No caso do Sertanense julgo que a mudança é contra a vontade dos dirigentes do clube da casa.
E uma vergonha. Decidiu a Federação (e bem), que esta primeira eliminatória com clubes da 1ª liga seria jogada sempre em casa da equipa do escalão inferior, e afinal para que? Apenas para depois vermos estas palhaçadas...

Realmente falta seriedade aos nossos dirigentes.
Apenas isso, seriedade.

luis cirilo disse...

Caro luso:
A FPF decidiu, e bem, que a eliminatória fosse jogada em casa do clube do escalão inferior.
Mad depois pactua com estas mudanças de local.
É um verdadeiro faz de conta

Unknown disse...

Mas esta competição não é organizada pela fedaração. Estes clubes que dizem que não têm condições para jogar com certos clubes, como é que têm condiçoes para jogar no campeonato deles? Onde está a coerência da federação? H.M.

luis cirilo disse...

Caro H.M.
É precisamente essa a questão. A mesma FPF que no sorteio da Taça obriga os clubes de escalão superior a jogarem fora depois permite que eles joguem em campos teoricamente neutros mas onde tem muito mais adeptos que os clubes supostamente a jogarem em casa.
Uma farsa.