Amanha, no seu dia normal de saída, o Charlie Hebdo volta ás bancas.
Com uma tiragem de três milhões de exemplares (!!!) em vez dos sessenta mil que por norma tira semanalmente,
São dois sinais de resistência ao terrorismo.
O sair no dia normal,como se nada tivesse acontecido, e uma tiragem absolutamente invulgar que visa dar prova pública de que o terror não só não vence como redobra a vontade de lhe fazer frente por todos os meios.
Naturalmente que o publicar esta capa, retratando o profeta Maomé (uma autêntica heresia para os radicais islâmicos), é a terceira e mais decisiva prova de resistência dada por que faz o jornal e por quem os apoia nestes momentos tão difíceis.
É a prova de que não tem medo.
Dada não por heróis abstractos, como esses que povoam as redes sociais, mas por gente que viu a morte de perto e só não morreu por absoluto acaso ou porque Deus/Alá não quis.
Esta saída do jornal e a gigantesca manifestação de Paris, mais pelas pessoas anónimas que pelos "notáveis" que nela participaram são sinais importantes de resistência e de defesa de valores fundamentais como a Liberdade.
Se aqueles a quem os sinais se destinam os vão entender isso já é, infelizmente, outra história.
Mas que em nada retira mérito e valor ao que está a ser feito.
Depois Falamos.
9 comentários:
Não sei como devemos enfrentar situações como as que ocorreram em Paris, mas que vão ocorrendo, até com um número de vítimas ainda mais expressivo, um pouco por todo o mundo.
O que me parece, isso sim, é que a distinção entre «nós» e os «outros» é um mau caminho. Os «perigosos terroristas» que por aí andam são uma parte de nós. Não se trata, por isso, de um «choque de civilizações», mas de algo que nós produzimos e continuamos a produzir – nos guetos das nossas cidades; no sistema económico e financeiro global que assenta em desequilíbrios e exclusões; na convicção arrogante de que, perante o nosso superior modo de vida, só resta aos outros a integração e submissão
De uma certa forma somos ainda os velhos mestres coloniais. A cruz e o gládio que levávamos em cada mão dará lugar hoje a um cartaz e a um lápis. Ainda bem que assim é, mas convém olhar com atenção e ver quantos dos marchantes não ostentam ainda o velho chapéu colonial.
Uma coisa é certa : Não foi só a França que foi atacada: Foi a LIBERDADE.
Agora vai ser preciso resistir à tentação da amalgama. Receio que os racistas de todas as vertentes políticas aproveitem para escarrar sobre o Islão, ou antes sobre os Árabes em geral pois que ninguém faz a diferença, como se todos os brancos cristãos fossem católicos integristas.
Como o meu Amigo Cirilo, também eu não apreciava tudo no Charlie Hebdo, que troçava de todas as religiões, por vezes ferozmente , exercício perigoso entre os mais perigosos, e que também não gostava da Marseillaise e dos seus cantos guerreiros.
Se a França deve proteger todos os Judeus de França, presentes desde há dois mil anos no país, também deve proteger os Muçulmanos , que agora têm medo e pedem perdão, porque dois em 5 milhões de muçulmanos assassinaram os seus compatriotas Franceses. Isto porque já há quem peça o regresso da pena de morte.
A estigmatização do Islão, atiçada pelos extremistas da direita, que esperam tirar beneficio do medo ambiente, pode levar longe demais.
Eu prefiro o exemplo do primeiro ministro Norueguês que, aquando do massacre perpetrado por um branco norueguês , Breivik, causando a morte de mais 200 jovens socialistas, declarou: Não aplicarei novas leis de segurança, mas, ao contrário, desenvolveremos ainda mais a democracia, para mostrar aos fanáticos que não temos medo e que a Noruega não cede ao fanatismo nazi.
Desculpe o texto um pouco longo. Cumprimentos.
Freitas Pereira
Primeiro ... nada justifica assassinar pessoas por um estupido de um cartoon.
Dito isto, dizer que a França é uma terra em que impera a liberdade de expressão não deixa de ser cómico.
Se uma mulher quiser ir para uma sala de aula de burka, é impedida. Se alguém no Facebook começar a especular como seria interessante matar meia dúzia de soldados franceses, minutos depois tem a polícia em casa. Se alguém se atrever a fazer um cartoon a negar o holocausto, vai a tribunal.
Há sim liberdade de expressão para apelidar Maomé de pedófilo, isso já é permitido!
Quando alguém acha que ameaçar a vida de policias, ainda que pelo facebook e um simples desenho num papel têm o mesmo grau de gravidade, não há muito que possamos dizer. Em relação à burka no exterior, acho muito bem que as proibam, da mesma forma que acho bem que no Brasil uma pessoa com um capacete de motard não possa entrar num banco, não sou contra a burka porque ache aquilo um vestido horrivel, um cortinado demode, nem porque não goste de muçulmanos, sou contra a burka porque ela serve para esconder identidades e sempre que alguém precisa de esconder a identidade é porque não vai fazer coisa boa.
Hélder Marinho.
Caro Joaquim de Freitas:
Escrevi noutro texto que o pior dos erros seria à boleia deste crime ostracizar os muçulmanos e o próprio Islão.
Que é uma religião com a qual nada me identifico face a algumas "componentes" pré históricas de que se reveste nomeadamente em relação ás mulheres.
Creio que as sociedades atacadas por esses criminosos que em nome do Islão se permitem matar como retaliação a coisas de que não gostam (como cartoons) é precisamente fazer aquilo que o PM norueguês preconiza. Desenvolver a democracia! E já agora tomar como prioridade absoluta o combate à pobreza e ao desemprego que são o "ninho" onde se desenvolvem e crescem muitas destas ameaças.
Caro MF:
A França é um país de Liberdade.
Mas a Liberdade é um bem precioso e por isso tem de ser defendida contra as ameaças que lhe são feitas. E uma das formas de o fazer é defender a liberdade individual dos cidadãos e proteger os seus direitos fundamentais. A proibição da burkha é justa e insere-se nesses principios. Ou acha que há alguma mulher que use esse vestuário aberrante por opção própria? E acho muitíssimo bem que quem se dedica a tão interessantes "especulações" no facebook ou noutras redes sociais seja responsabilizado por isso. Brincar com a Vida não tem piada!
Caro Hélder Marinho:
Concordo consigo. E acrescento que a burkha é uma opressão inaceitável sobre as mulheres. Como tantas outras a que estão sujeitas nos países islâmicos. Que vão do direito que não tem à Educação a coisas tão ridiculas como serem proibidas de tirar carta de condução ou entrarem em recintos desportivos
O Deus Pai que Jesus Cristo deu a conhecer ao Mundo nada tem a ver com o Alá. É outro deus. A tese mais provável, segundo muitos estudiosos, entre os quais eu, é que este Alá, 600 anos depois da vinda de Jesus Cristo, tenha sido forjado pelo Maomé com base em trechos do Antigo Testamento. É um Deus interessado na expansão territorial, com objetivos políticos e militares bem definidos.
É impossível que aquele Deus bondoso e misericordioso do Novo Testamento, disposto a perdoar, apareça irreconhecível no Alá de Maomé que vingou num meio amplamente politeísta. Deus não é vira-casacas. Os homens sim. Mudam-se os desejos, mudam-se as vontades ao sabor das conveniências e dos interesses.
A pergunta que coloco é de saber até quando, nós cristãos, seremos tolerantes em aceitar conviver com uma das maiores mentiras milenares de que há memória? Grande parte dos muçulmanos não têm culpa porque o problema está na génese de uma falsa religião suportada por uma mentira que só ao diabo lembra.
Veja Sr. Luís Cirilo, que aquilo que acabo de dizer, em que acredito firmemente, se o afirmasse publicamente, dar-me-ia pena de morte na Arábia Saudita e no Irão.
Quim Rolhas
Caro Quim Rolhas:
Respeito quem professa o islamismo independentemente dos pressupostos em que assenta essa religião. Mas devo dizer-lhe que não tenho qualquer simpatia por ela precisamente com base nalgumas das situações que expôs.
Aliás qualquer crença que assenta no radicalismo, na intolerância, num fundamentalismo com aspectos bárbaros e pré históricos não pode merecer qualquer tolerância quanto mais simpatia.
Com certeza muitos conflitos ao longo da história têm sido ostensivamente por motivos religiosos, com muitas religiões diferentes envolvidas. Por exemplo, no Cristianismo, tem havido (só para citar algumas):
• As Cruzadas - Uma série de campanhas entre os séculos XI e XIII, com o objectivo declarado de reconquistar a Terra Santa dos invasores muçulmanos e vir em auxílio do Império Bizantino.
• As Guerras Religiosas Francesas - Uma sucessão de guerras na França durante o século 16 entre os católicos e os protestantes huguenotes.
• A Guerra dos Trinta Anos - Outra guerra entre católicos e protestantes durante o século 17 no território que é hoje a Alemanha.
Esta lista não é de forma alguma exaustiva. Além disso, pode-se adicionar a Rebelião Taiping e o Conflito da Irlanda do Norte. O Cristianismo tem certamente sido um factor em muitos conflitos ao longo de sua história de 2.000 anos.
No Islão, vemos o conceito de jihad, ou "guerra santa." A palavra jihad significa, literalmente, "luta", mas o conceito tem sido usado para descrever a guerra na expansão e defesa do território islâmico. A guerra quase contínua no Oriente Médio ao longo do último meio século certamente tem contribuído para a ideia de que a religião é a causa de muitas guerras. Os ataques de 11 de setembro nos Estados Unidos têm sido vistos como uma jihad contra o "Grande Satão" América, que, aos olhos muçulmanos, é quase sinônimo do Cristianismo. No Judaísmo, as guerras de conquista narradas no Antigo Testamento (em especial o livro de Josué), sob o comando de Deus, conquistaram a Terra Prometida.
O ponto é bem óbvio de que a religião tem certamente exercido um papel significativo em grande parte do combate na história humana.
Para além do aspecto religioso, compreender e analisar para agir é imperativo afim de evitar as instrumentalizações e deslizes duma emoção, duma cólera e duma revolta legítima. A comparação dos méritos duma religião em relação a outra é uma característica do que se deve evitar. Deus só há um. E se ele fosse o mesmo para todos?
Não tomar em conta as causas profundas e imediatas, isolar as consequências que as faz emergir e não inscrever um acontecimento tão violento nos factores que o tornaram possível condena à tetania, e no pior dos casos a uma guerra de religiões. E em França, em presença de 5 milhões de muçulmanos, à guerra civil.
Não sejamos hipócritas: As causas vêm de longe e têm a dimensão internacional. A França , como os USA, é uma potência em guerra no planeta. Do Iraque à Síria, passando pela Líbia e o Afeganistão para o petróleo, do Mali à Centrafrique, passando pelo Congo, para os minerais estratégicos, os soldados franceses estão envolvidos em combates contra os muçulmanos.
O fim dos equilíbrios mundiais no fim da segunda guerra mundial com o desaparecimento da URSS, ligado a uma globalização capitalista centrada sobre a redução dos custos para maximizar os lucros, fazem das matérias primas a causa principal das ingerências, intervenções e guerras contemporâneas.
Basta recordar que entre 1990 e 2001 o número de conflitos explodiu: 57 conflitos em 45 territórios distintos. Legitimado sempre por razoes virtuosas: defesa da liberdade, democracia, justiça. Realmente as guerras permitem controlar economicamente um país, mas também de açambarcar as matérias-primas (petróleo, urânio, minerais, etc.) ou os recursos humanos dum país.
Desde o 11 Setembro 2001, o discurso de legitimação das guerras construiu-se essencialmente sobre o "perigo islamista" contribuindo ao desenvolvimento duma islamofobia visceral a grande escala nas potências ocidentais.
Estas guerras produzem um "sólido ódio" do ocidente nos povos vitimas destas agressões militares. Aonde? No Próximo e Médio Oriente, exactamente lá onde o ocidente quer assegurar o controlo das riquezas energéticas.
Isso explica o apoio das democracias ocidentais aos piores regimes ditatoriais que conhecemos : as petro monarquias. Alguns desfilaram em Paris em nome da luta pelos direitos do homem !!!
Devemos unir-nos na luta contra o anti semitismo, o racismo, a apologia do terrorismo, mas cuidado : não obriguemos milhões de muçulmanos que vivem connosco a justificar-se todos os dias, só porque meia dúzia de loucos assassinos muçulmanos mataram cegamente. E não se deve troçar da sua religião só porque a nossa seria mais antiga.
Como não exigimos a todos os cristão reais ou supostos uma condenação quando o Norueguês Anders Behring Breivik assassinou 77 ^pessoas em 2011, reivindicando a islamofobia e o nacionalismo branco.
Freitas Pereira
Caro Amigo: Mais uma vez perdão pelo texto, extenso.
Caro Freitas Pereira:
Eu é que agradeço a extensão dos seus comentários tal o acréscimo de qualidade que significam para os temas que por aqui vou postando.
Creio que esta sua análise, rigorosa e desapaixonada, aos tempos que vivemos e à "diabolização" do islamismo que alguns pretendem quase como uma política oficial é uma reflexão importante para ajudar a distinguir o essencial da "espuma" com que por vezes se pretendem encobrir as causas.
Creio que todos estaremos de acordo na rejeição do radicalismo, do fanatismo, dos crimes que se cometem em função de supostas directivas oriunda da religião e da fé. Mas esses crimes nunca foram,nem são, exclusivos do Islão como se sabe. Já o disse e repito: Não tenho nenhuma simpatia pela religião islâmica e muito menos por essas ditaduras brutais que referiu e que são o principal suporte do terrorismo feito em nome de Alá. Mas aquilo a que se convencionou chamar o "Ocidente" (EUA e União Europeia) também tem as suas responsabilidades naquilo que é hoje um antagonismo crescente em relação aos nossos valores civilizacionais. Precisamente pelas razões que referiu. Cobiça, exploração, capitalismo "selvagem". E isso paga-se.
Enviar um comentário