terça-feira, março 15, 2022

Flávio

O meu artigo desta semana no zerozero.pt

A complexidade de que se reveste hoje o futebol profissional vai muito para lá dos golos e das defesas, dos dribles e dos desarmes, das tácticas e contra tácticas, das estratégias e planos de jogo, da preparação física e metodologia de treino.
Passa por muitas outras variáveis.
Pela medicina desportiva, pela alimentação dos atletas, pelo treino invisível, pela qualidade dos relvados, pelos centros de estágio, pelos equipamentos, pela estrutura que liberte os jogadores de outras preocupações que não o desempenharem a sua profissão sempre nos limites.
Mas também pela preparação a nível mental.
Feita por gente habilitada para o efeito com conhecimentos científicos e não por “bruxos” como aconteceu durante muito tempo (e há quem diga que ainda acontece…) nalguns clubes portugueses de primeiro plano e em que ficaram famosas algumas rábulas protagonizadas por esse tipo de personagens.
Mas para lá de tudo isso, que já não é pouco, há ainda outros aspectos que são importantes na envolvência de um plantel profissional e na sua preparação para as competições em que se veja envolvido.
Refiro-me à importância de existirem na estrutura dos clubes, em funções e cargos diversos, pessoas que pelo seu passado na instituição, pelo conhecimento que dela tem, pela autoridade moral de terem sido exemplos e ídolos dos adeptos, pelos conhecimentos que podem transmitir a quem chega de novo (e hoje a rotatividade dos planteis é muita e acelerada) se tornam em elos muito importantes no sucesso das equipas.
A nível de futebol mundial, e nacional também, são muito os exemplos conhecidos.
Beckenbauer, Rummenigge e Hoeness no Bayern, Butragueno no Real Madrid, Leonardo no PSG, Futre no Atlético de Madrid, Maldini no Milan são apenas alguns dos muitos exemplos de ex jogadores que depois ocuparam ou ocupam cargos na estrutura dos clubes.
Em Portugal também são conhecidos os casos de Shéu e Rui Costa no Benfica, Hugo Viana no Sporting, Paulinho Santos e João Pinto no Porto, Fary e Alfredo no Boavista, entre outros como exemplos do mesmo.
No Vitória Sport Clube quando se quer apontar alguém como portador da mística vitoriana nos tempos que correm há sempre três nomes que vem logo à memória.
Neno, Moreno e Flávio Meireles acima de todos.
Neno infelizmente faleceu, Moreno treina o Vitória B onde vem fazendo um bom trabalho e Flávio Meireles desempenhou nos últimos dez anos funções de director desportivo e coordenador das equipas profissionais do clube depois de uma curta passagem pela equipa técnica de Rui Vitória após o término da sua carreira de jogador.
Quis o destino que fosse precisamente comigo como vice-presidente para o futebol (e modalidades), em abril de 2012, que Flávio Meireles tivesse assumido as funções de director desportivo na primeira direcção de Júlio Mendes.
E nos poucos meses que trabalhamos juntos (eu sairia da direcção em dezembro de 2012) pude confirmar o que já levara á sua escolha; para lá de ser um grande vitoriano, o que ajudando ao exercício do cargo não podia ser critério único de escolha, revelou-se um colaborador empenhado, inteligente, atento e de enorme lealdade.
E nos quase dez anos seguintes Flávio Meireles continuou a merecer a confiança das administrações da SAD vitoriana tornando-se um elo importante na ligação das mesmas à equipa e o verdadeiro portador da mística vitoriana bem patente na forma como tantas e tantas vezes se insurgiu (e quantas vezes sozinho…) contra erros e injustiças das equipas de arbitragem que prejudicavam o Vitória.
Levou amarelos, levou vermelhos, levou suspensões, mas defendeu o Vitória.
Com o brio, a garra e a honra com que o fazia dentro do relvado com a camisola vestida.
Nas últimas eleições no clube viu-se envolvido, sem qualquer responsabilidade no assunto, na campanha eleitoral com uma das listas a apontar o seu nome como exemplo de recursos que existiam dentro do Vitória capazes de o servirem, no caso como director desportivo, dispensando a necessidade de recrutar fora colaboradores para essas e outras funções.
Isso levou a que Flávio Meireles tivesse sido temporariamente afastado da equipa e agora por decisão própria a cessar funções no clube provavelmente desgostoso com uma sucessão de acontecimentos para os quais em nada contribuiu, mas dos quais foi a única vítima!
Penso ser uma perda grave para o Vitória.
Que já não tendo Neno junta da equipa perde agora, felizmente por razões bem diferentes, aquele que durante os últimos vinte anos foi o exemplo maior da mística vitoriana quer como jogador quer como dirigente com reflexos que não é possível avaliar neste momento.
Conhecendo Flávio Meireles, conhecendo o seu amor ao Vitória, conhecendo o seu percurso desde a formação até aos dias de hoje estou certo de que não estamos perante um “adeus”, mas apenas perante um “até já”.
Vitória e Flávio Meireles ainda tem muito para fazerem em conjunto.
Porque o Vitória precisa de Flávio Meireles e Flávio Meireles ainda tem muito para dar ao clube.

P.S. Flávio Meireles tem dois filhos a jogarem no Vitória. O Lourenço e o Afonso. Sendo que este último já é internacional sub-15 por Portugal. E ambos vão continuar no Vitória na próxima época. Há quem lhe chame ADN. Do pai e dos filhos!

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