O meu artigo desta semana no zerozero.
António Pimenta Machado, o mais carismatico de todos os presidentes
que o Vitória teve nos seus 98 anos de História completou, ontem dia de Páscoa,
o seu septuagésimo aniversário natalício altura que me parece apropriada para
neste espaço tecer algumas considerações sobre o seu trajacto de vinte e quatro
anos como líder do Vitória.
Quando em 1980 António Pimenta Machado (APM) chegou à presidência do
Vitória, depois de já ter integrado os orgão sociais no mandato de António
Rodrigues Guimarães o que era o Vitória Sport Clube?
Um clube simpático, na melhor acepção do termo, que jogava
tradicionalmente bom futebol e se apurava de longe a longe para as competições
europeias , sem património próprio, com as modalidades amadoras reduzidas ao
andebol, voleibol e ténis de mesa, sem qualquer peso nos orgaõs dirigentes do
futebol português e que era conhecido pelo “Guimarães” para se distinguir do “Setúbal”
nome dado ao Vitória sadino.
Patrimonialmente, área em que APM deixou fortissíma marca, qual era a
realidade do Vitória?
Tinha a sede num edíficio alugado no centro da cidade no qual
coabitavam direcção, serviços administrativos, cobradores de cotas no rés do
chão e ténis de mesa numa sala do segundo andar se não me falha a memória.
Um edíficio velho, alugado, no qual nos últimos anos de ocupação já
chovia lá dentro nos andares superiores.
O estádio era municipal.
Sem iluminação, bancadas de cimento a “quilómetros” do relvado, por
força de uma pista de cinza que apenas servia para a chegada de uma ou outra
etapa da Volta a Portugal em bicicleta, com a parte superior da central e os camarotes
em madeira (sim, em madeira) , balneários no lado oposto ao actual num
autêntico bunker enterrado a enorme profundidade e sem qualquer conforto,
parques de estacionamento em volta do estádio em terra que nos dias de chuva se
transformava num autêntico lamaçal.
O relvado era fraco, no inverno horrível porque a ribeira que passava
por baixo o mantinha inundado, e a equipa passava largos períodos sem o poder
usar à semana para treinar porque se o
fizesse no domingo não havia relva para jogar. Pelo que treinavam por trás das
balizas, na pista de cinza e em outros espaços contíguos.
Havia ainda um campo pelado, onde hoje fica o Complexo Desportivo
António Pimenta Machado, que servia essencialmente a formação que se vira
privada do saudoso campo da Amorosa demolido para a construção de um bairro de
habitação social.
Essa era a realidade patrimonial do Vitória.
O tal clube simpático que em 1968/1969 ficou a três pontos de ser
campeão, por força de uns roubos de igreja, e que em 1976 perdeu a final da
taça de Portugal face ao Boavista, devido a uma arbitragem miserável de um
sujeito chamado António Garrido, nos dois momentos em que esteve mais perto de
deixar de ser simpático e passar a ganhador.
Resta acrescentar que tradicionalmente o clube era presidido (e
dirigido) por industriais e comerciantes do concelho, homens estimáveis e que
deixaram um rasto de seriedade e vitorianismo intocáveis, que tinham no clube
uma segunda ocupação porque as priorides eram as suas empresas e os seus
negócios o que se compreendia perfeitamente nesses tempos há mais de quarenta
anos.
E precisamente por isso percebe-se que sem por minimamente em causa o
seu amor ao Vitória, a sua entrega e dedicação, havia “guerras” para as quais
não estavam talhados e nas quais não lhes convinha meterem-se por respeitáveis
razões.
Em 1980 com APM iniciou-se uma enorme revolução no Vitória.
Com vinte e nove anos de idade, financeiramente independente e sem
depender de nada nem de ninguém fosse para o que fosse, com um estilo e uma
personalidade muito próprios APM trouxe ao clube uma ambição de crescimento em
todos os patamares como até então nunca tinha existido pelo menos em
continuidade.
Desportivamente começou por contratar o melhor treinador português
desse tempo, e um dos melhores de todos os tempos, chamado José Maria Pedroto
que nos dois anos que treinou o clube lhe inculcou uma ambição de vencer que
perduraria por muitos e bons anos já o treinador não estava no clube.
Percebendo que com aquele estádio e aquele pobre pelado não ia a lado
nenhum deu inicio a uma enorme reformulação do estádio (ainda com Pedroto) para
a qual teve de travar batalhas épicas com o munícipio sendo várias as vezes em
que os vitorianos tiveram de vir para a rua manifestarem-se em apoio das
reivindicações do seu presidente.
Mas levou a sua avante.
O estádio foi remodelado em várias etapas com novas bancadas e
cobertura das mesmas, deslocação do terreno de jogo, drenagem da tal ribeira,
novos balneários, iluminação e outras benfeitorias que permitiram que Guimarães
fosse uma das cidades sede do Mundial de sub 20 em 1991 e posteriormente a única cidade que não era
capital de distrito a receber jogos do Euro 2004.
E tudo isso se deveu, em primeira linha, à persistência e teimosia de
APM (sem retirar mérito a alguns dos que com ele colaboraram nesse tempo e que
foram também eles importantes para que tudo fosse possível) que dos governos
aos executivos municipais nunca poupou ninguém à sua capacidade reivindicativa.
Mas a sua grande obra foi o complexo desportivo a quem os associados
em Assembleia Geral viriam a dar , justamente, o seu nome embora bem contra a
sua vontade.
Num tempo em nenhum clube português tinha instalaçóes desportivas
específicas para treino e competições do futebol de formação, mesmo os clubes a
quem chama “grandes” tinham apenas relvados e pelados à sombra dos seus
estádios, APM construiu no Vitória um complexo desportivo de raiz com vários
relvados, um edíficio sede com vários pisos no qual passou a funcionar todo o
clube (direcção e os vários serviços) e um pavilhão no qual as modalidades
tiveram finalmente o seu espaço próprio.
Relevando também o papel do eng José Arantes, importante no
crescimento patrimonial do clube, não tenho dúvida que foi a capacidade de APM
de ver à distância , e a sua capacidade reivindicativa junto dos poderes, que
permitiu ao clube ser pioneiro em termos de complexos desportivos em Portugal.
Em termos desportivos, nomeadamente no futebol, o Vitória foi ao longo
dos vinte e quatro anos de presidência de APM um clube de primeira linha na
luta pelas classificações europeias pese embora alternando isso com algumas
épocas de menor brilho e uma ou outra até de alguma aflição por força de coisas
que não correram bem.
Essencialmente por três razões: Mudanças de treinador com alguma
frequência (APM não era um presidente fácil para os treinadores), grupos de
trabalho que por isto ou aquilo não corresponderam ao que deles se esperava e
essencialmente (há muita gente, até no
Vitória que não se lembra disto) porque a década de 90 e início do século XXI
foram os anos terríveis do “apito dourado” com o grande rival desses tempos, o
Boavista, a ter um peso nas estruturas do futebol que o faziam, de forma
figurada, começar cada campeonato com dez pontos de avanço em relação ao
Vitória. Foi um tempo em que cada vez que o Vitória se classificou à frente do
Boavista teve de ser muito melhor que o adversário para o conseguir.
E também por isso , mas não só porque também cometeu erros, APM apenas
conseguiu ganhar uma supertaça em vinte
e quatro anos de presidência o que constitui um pecúlio bem abaixo do que seria
legítimo esperar face ao dinamismo e crescimento que imprimiu ao clube.
Talvez, também, porque a partir de certa altura APM enveredou por um
isolacionismo que o levou a desvalorizar o ter gente do clube na FPF, na Liga, no
Conselho de arbitragem,na Associação de Futebol de Braga e face à representação
de outros clubes nesses orgãos o Vitória foi sendo progressivamente prejudicado
em prol dos interesses de quem enveredara por outra estratégia.
Finalmente há que dizer que APM também nunca receou outro tipo de “guerras”.
Nomeadamente com a comunicação social nacional e local (neste caso foi um erro
de que não vale a pena falar agora mas o próprio reconhece que deu ao assunto
uma importância excessiva) porque quando considerava que o Vitória estava a ser
mal tratado não hesitava em levantar voz (e a sua voz era ouvida no país
futebolístico) e fazer frente fosse a quem fosse.
E por isso, por uma vez, o Vitória teve um presidente cujo mediatismo
e reconhecimento nacional não temiam comparações com as dos presidentes dos
chamados”grandes” o que ajudou o clube a ultrapassar alguns dos bloqueios que o
“sistema “ lhe ia pondo pelo caminho.
APM presidiu ao Vitória durante vinte e quatro anos.
Deixou a presidência do clube há dezasseis, no corolário de um
processo vergonhoso de contornos políticos cuja história está por fazer na sua
totalidade, mas ainda hoje é para muitos vitorianos, e não só, a grande
referência na história de 98 anos do clube.
Em termos pessoais acompanhei de muito perto os seus mandatos( como
associado, como comentador na comunicação social local e como dirigente do clube) e com ele estive nos orgãos sociais durante
sete anos.
A História se encarregará , a seu tempo e com o distanciamento
necessário, de fazer o balanço da presidência de António Pimenta Machado.
Por mim não tenho nenhuma dúvida que em 2004, quando saiu pelo seu pé,
deixou à posteridade um clube muito maior e muito melhor a todos os niveis do
que aquele que tinha encontrado em 1980.
E isso para mim é o suficiente para o considerar o melhor Presidente
da História do Vitória Sport Clube.
2 comentários:
Muito boa análise, com a qual concordo plenamente!P.M. foi de longe a figura maior da história do nosso querido Vitória.Espero, por que será bom sinal,que rapidamente seja destronado deste raking.Aproveito para lhe desejar longa vida com saúde.
Cumpts.
J.M.
Caro J.M.
Seria fantástico. Mas não me parece nada provável.
Obrigado pelos votos de saúde. Retribuo
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