Júlio Mendes sucedeu a ele próprio nas eleições mais disputadas da História do Vitória e naquelas que foram também as mais participadas de sempre.
O que é, a elevada participação dos associados, um inequívoco bom sinal.
Embora o número de associados em condições de exercerem o voto não o seja!
Frente a frente estavam duas listas.
A lista B (que saiu vencedora) em que se recandidatavam todos os membros eleitos em 2015, sem nenhuma alteração nos elencos, o que pressupunha a ausência de qualquer renovação naquilo que era um óbvio risco face à total inovação da outra lista em que nenhum dos seus membros tinha jamais ocupado cargos directivos no clube.
Com ela a lista B tinha um percurso de seis anos (embora os primeiros três já tivessem sido avaliados em 2015) com acertos e erros, com oscilações de monta nas classificações do futebol, com algumas polémicas e assuntos mal explicados que preocupavam os sócios como o anunciado interesse da BMG na compra das acções de Mário Ferreira.
Mas também com uma comunicação deficiente, com lacunas e más explicações, que se arrasta desde há muito tempo e que não lhe permitiu explicar devida e atempadamente,por exemplo, a redução do passivo que era umas das suas bandeiras de campanha.
Embora credora de um capital de reconhecimento face a alguns resultados desportivos e financeiros a candidatura liderada por Júlio Mendes dava evidentes sinais de algum desgaste e originava em muitos associados a sensação de que era preciso mudar.
Do outro lado estava a lista A.
Com o mérito de se oferecer como alternativa, com a inovação de pretender trazer para a gestão do clube um conjunto de pessoas sem qualquer experiência na matéria mas com bons percursos profissionais na maioria dos casos, com a coragem de defrontarem todos os "poderes" da comunidade vimaranense dos políticos aos,imagine-se, religiosos.
Mas também com dois "pecados originais":
A candidatura tinha o evidente ar de ser de um grupo de amigos (especialmente nos principais cargos) com tudo que isso tem de limitativo em termos de abrangência eleitoral e embora os candidatos apresentados fossem aqueles radicou-se em muitos associados a convicção de que havia alguém por trás o que obviamente não favorecia a imagem da candidatura.
E todos esses condicionalismos, de ambas as listas, levaram a que se desse o fenómeno de haver muita gente que votou A porque se queria ver livre da B de qualquer maneira e também muita gente que votou B porque tinha receio da A.
É a vida.
Há que dizer que a lista A arrancou bem melhor que a lista B para a campanha eleitoral.
Anunciada de forma original(lonas nas varandas) , foi rapidamente e em força para o terreno com um programa intenso de sessões nas freguesias e o lançamento de uma boa campanha nas redes sociais que lhe valeu desde logo muitas adesões.
A par disso Júlio Vieira de Castro esteve francamente bem nas entrevistas que concedeu, mostrando à vontade perante a comunicação social e um bom domínio dos temas o que desde logo lhe valeu muitas simpatias e um estatuto presidenciável que até então obviamente não tinha.
A lista B, por seu turno, arrancou mais tarde e menos bem apostando numa grande sessão de apresentação do programa (em Vila Flor)que se revelou demasiado grande na duração e demasiado curta na eficácia de transmissão de ideias pese embora conceptualmente ter sido muito interessante com Júlio Mendes a replicar Steve Jobs nalgumas sessões de apresentação de iphones da Apple.
Por outro lado a aposta em antigos jogadores e em vips do universo político vimaranense terá sido pouco reprodutiva em termos eleitorais num caso porque era pouco relevante o apoio de quem cá esteve mas já não está e noutro a abrangência política da esquerda à direita "cheirou" a "União Nacional" e deu a muito apoiantes da lista A a dupla motivação de derrotarem a direcção que estava e simultaneamente os políticos da terra.
As coisas são o que são!
E nem aqui refiro, porque não me parece que tenha sido da responsabilidade da candidatura, aquele inacreditável "número" dos boletins paroquiais que não rendeu um voto à lista B e te-la-á, isso sim , feito perder um bom número deles.
Não admira, pois, que a incerteza no resultado tenha acompanhado estas eleições até ao fim.
Pessoalmente, que as acompanhei de perto e com todo o interesse, creio que a vitória da lista B só se começou a desenhar na ultima semana porque até lá as coisas pareciam estar mais para a A do que para a B.
Mas na ultima semana tudo correu mal à lista A.
A começar pelo debate.
Para vencer as eleições era importante que Júlio Vieira de Castro vencesse claramente Júlio Mendes.
Não venceu.
E teve até a sua pior prestação comunicacional da campanha muito "ajudado" pelos seus "treinadores de bancada" que em vez de o deixarem concentrar-se na apresentação dos seus argumentos e na réplica aos argumentos do adversário passaram o debate a quebrar-lhe o raciocínio e a distrai-lo com o envio de constantes sms para o telemóvel.
Um erro crasso especialmente quando direccionado para quem não tinha experiência de debates.
E isso, mais uma argumentação bem estruturada, permitiu a Júlio Mendes vencer o debate e inverter a tendência que parecia desenhar-se de uma vitória da lista A.
Depois o plano financeiro.
Que no debate não existia, depois passou a existir, e que foi uma machadada tremenda na própria lista A.
Porque falava de milhões que ninguém exigia a JVC que apresentasse, porque não explicava de onde vinham esses milhões (o que era caricato numa lista que acusava a outra de falta de transparência) e porque levantava legítimas duvidas sobre a continuidade dos direitos do Vitória enquanto detentor de acções da categoria A que lhe garantem importantes poderes de veto.
Se o debate tinha corrido mal o plano financeiro correu pior.
Porque para além do atrás exposto permitiu a Júlio Mendes o seu melhor momento de campanha quando em conferência de imprensa desmontou ponto a ponto, com uma argumentação claramente perceptível e tecnicamente inatacável, o proposto pela lista A.
Foi talvez esse, com a excelente prestação de Júlio Mendes, o momento de viragem definitiva das intenções de voto.
E como tudo que pode acontecer...acontece (aprende-se na actividade seguradora) eis que Ziad "entra em campo". Não para marcar golos como os que geraram o nosso contentamento vitoriano de outrora mas para, ó ironia, marcar alguns auto golos à própria lista que apoiava.
Sejamos claros.
Ziad enquanto grande jogador da nossa memória colectiva, Ziad enquanto parceiro de negócios que abriria ao Vitória portas internacionais importantes, Ziad enquanto entidade distante das eleições mas que prometia ser um factor decisivo no Vitória desportivo e financeiro do futuro valia votos e gerava expectativas que seriam interessantes para a mais valia eleitoral da lista A.
Ziad "em campo", prometendo milhões mas não explicando de onde vinham, atacando Júlio Mendes e Armando Marques do "alto" dos seus dois meses(!!!) de associado e relembrando entrevistas de 2006 em que afirmava que queria ser presidente de um clube onde apareceu duas ou três vezes em doze anos mais não foi do que um enorme tiro no pé de uma lista que nele depositava tantas esperanças.
Não quero com isto dizer que Ziad não pudesse ter sido (ou até venha a ser sabe-se lá que a vida dá tantas voltas) alguém importante para o Vitória do futuro.
Apenas que a estratégia e o contexto em que interveio foram errados.
E por isso, tal como acontece em todas as eleições, da soma do mérito de quem ganhou e dos erros de quem perdeu se construiu um resultado eleitoral que traduziu a vontade maioritária dos associados que acorreram às urnas.
E o futuro?
Parece-me claro que Júlio Vieira de Castro e a sua equipa prestaram um relevante serviço ao Vitória ao concorrerem às eleições, ao trazerem pessoas e ideias para a campanha e certamente que o clube no futuro poderá continuar a contar com eles.
Esperando naturalmente que tenham aprendido com os erros e que os estados de alma traduzidos pelas declarações infelizes de vários dos candidatos na noite eleitoral não passem disso mesmo , de estados de alma de quem perdeu por tão pouco.
Com a curiosidade de aquilo que foi uma fragilidade eleitoral -o serem um grupo de amigos- poderá paradoxalmente ser agora um trunfo ao permitir-lhes manterem-se unidos e actuantes na realidade do clube.
Quanto a Júlio Mendes e à sua equipa, como o próprio teve a sensatez e humildade de reconhecer no discurso de vitória, estas eleições foram um sinal que os associados lhes deram no sentido de que há coisas a modificar, coisas a melhorar e que é importante a união de todos em prol do Vitória.
E fez bem ao referir que conta com os membros da equipa A para esse esforço de construir um Vitória maior porque é a quem ganhou que compete unir.
Agora há duas coisas que Júlio Mendes e a sua direcção sabem:
Não vão ter "estado de graça" nem margem de erro.
Este resultado obriga-os, desde já, a fazerem mais e melhor na gestão do clube e também da SAD porque há , de facto, muita insatisfação com os resultados desportivos e essa insatisfação não vai perder nenhuma oportunidade de se fazer sentir.
Apostar a sério no futebol, melhorar a comunicação, apoiar o ecletismo, continuar a reduzir o passivo, serenar a estrutura accionista e potenciar a área comercial e de marketing rentabilizando mais a "marca Vitória" são alguns dos desafios imediatos a que a direcção tem de dar resposta eficaz para provar que percebeu a mensagem que os associados lhe quiseram transmitir.
Foi assim que vi e interpretei este acto eleitoral.
Para mim, e espero que para todos os vitorianos, as eleições acabaram com a divulgação dos respectivos resultados.
Não há vencedores nem vencidos, não há vitorianos bons e vitorianos maus, não há associados melhores e associados piores.
Há o Vitória.
Que é de nós todos.
E por isso todos temos de tomar conta dele com tudo que isso significa de vitorianismo, de sentido critico, de liberdade de opinar.
Depois Falamos.