Publiquei este artigo em "A Economia do Golo"
Não gosto de António Costa.
Não gosto da sua política, da forma como governa, do governo que formou com ministros que em boa parte se tem revelado um fracasso.
Mas também não gosto dele pessoalmente.
Acho-o arrogante, hipócrita, desprovido de escrupulos, mentiroso e com tiques de dono disto tudo.
Postas as coisas com clareza, como sempre gostei, considero que a reunião que vai fazer hoje com o presidente da FPF, com o presidente da LPFP (que foi convidado à última hora mas aceitou porque não passa de um pau mandado do presidente do seu clube) e com os presidentes de Benfica, Porto e Sporting é uma canalhice feita ao futebol da qual ele é o principal responsável embora existam outros com grau de responsabilidade menor.
Que são os restantes que vão estar presentes.
E é uma canalhice porque fazendo sentido o governo reunir com as instâncias do futebol para decidirem do recomeço, ou não, dos campeonatos essa reunião se deveria fazer exclusivamente com a FPF que tutela todo o futebol e com a LPFP que representa todos os clubes profissionais e organiza os campeonatos não fazendo qualquer sentido a ela anexar clubes.
Tal como o governo faz, por exemplo, na concertação social onde reune com as centrais sindicais e não apenas com alguns sindicatos, com a confederação do comércio e não apenas com algumas associações comerciais, com a CIP e não com apenas algumas empresas.
Ao chamar a FPF, a Liga mais tarde e por arrasto da FPF ao que se lê, e ao escolher três clubes (não por acaso os que entre si terão mais de 85% dos adeptos de futebol no país, ou seja, mais votos em eleições legislativas) o governo está a passar duas mensagens que consubstanciam a tal canalhice.
A primeira é que só lhe interessa falar com os chamados "grandes", os mais fortes e com mais adeptos (leia-se votos) enquanto os restantes não passam de verbos de encher que apenas servem para compor jornadas da prova.
A segunda é a reconhecer explicita e definitivamente que no futebol português há filhos e enteados algo que árbitros, VAR, orgãos disciplinares e comunicação social há muito praticavam mas tem agora o reconhecimento oficial do governo.
E ao fazer assim, ao mostrar interesse pela opinião de três e um soberano desprezo pela dos restantes, o governo está a marginalizar, discriminar e humilhar todos os restantes clubes com uma arrogância e uma prepotência que se entenderiam numa ditadura mas não se aceitam num regime supostamente democrático em que todos deviam ser tratados por igual. Nos direitos e nos deveres.
E na consideração já agora.
Ao proceder desta reprovável forma o governo está a passar, e só não o entenderá quem não quiser ou for demasiado estúpido para compreender coisas tão simples, uma certidão de óbito à já quase inexistente verdade desportiva das competições profissionais de futebol.
Pois quando é o próprio governo, com a miserável cumplicidade de FPF e LPFP, a dizer que apenas três clubes contam quem é que doravante se vai preocupar com os interesses e direitos dos outros quando em confronto com qualquer um desses três?
É evidente que ninguém. Porque se já antes era o que era como será agora com a benção do governo a essa separação entre filhos e enteados.
Não se esgota porém em António Costa e no governo a responsabilidade por esta reunião vergonhosa.
Desde logo a FPF que a partir de hoje , ao aceitar participar na reunião e ao que parece a ter uma palavra a dizer quanto aos convites, deixa de poder ser vista como um orgão isento e acima dos clubes para passar a ser "madrinha" de três e parte activa na política de filhos e enteados que nos remete para o terceiro mundo do futebol.
A LPFP que supostamente representando todos os clubes esquece os "enteados aceitando participar ao lado dos "filhos" numa reunião que devia envergonhar todos quantos tivessem vergonha na cara e estivessem na direcção do organismo para servir os clubes e o futebol e não para serem correia de transmissão dos seus (três) clubes.
Finalmente Benfica, Porto e Sporting, que aceitando o convite em vez de remeterem a sua representação para a LPFP, provam uma vez mais que como noutras questões (direitos televisivos por exemplo) querem é tratar da vidinha deles estando-se nas tintas para todos os outros de quem só se lembram para aquelas negociatas de jogadores em que quase sempre são os únicos a ganhar.
É a reunião da vergonha entre os sem vergonha.
E os outros?
Os "enteados"'
Ao que se sabe estão calados.
Consentindo pelo silêncio nesta pouca vergonha e perdendo qualquer legitimidade de a partir daqui se queixarem seja do que for.
Desde a a forma como os donos disto tudo vão resolver hoje o destino dos campeonatos até a futuras arbitragens, decisões dos VAR, castigos dos orgãos disciplinares e discriminações de televisões e jornais.
Porque também eles aceitam, quietos e calados ( e nalguns casos contentes até), que no futebol português há filhos e há enteados, e que é assim que as coisas devem ser, porque caso contrário insurgir-se-iam contra o que se vai passar.
Se alguma vez tive dúvidas que o 25 de Abril nunca chegou ao futebol a partir de hoje tenho a certeza absoluta.
Não chegou!
Sem comentários:
Enviar um comentário