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sexta-feira, janeiro 05, 2024

O Dérbi Reluzente

 O meu artigo desta semana no zerozero.pt

Vitória e Sporting de Braga encontram-se amanhã no mais moderno estádio municipal de Braga para mais uma edição de um dérbi que é muito mais que um dérbi futebolístico sendo, isso sim, a tradução de uma quase milenar rivalidade entre duas comunidades que tem no futebol (e noutras modalidades) a sua expressão mais visível nos últimos cem anos.
Porque ao contrário de outros dérbis, como o Benfica vs Sporting ou o Boavista vs Porto (que também se disputa este fim de semana) que traduzem a enorme rivalidade entre clubes da mesma cidade já o Vitória vs Braga, como atrás se explicou, é muito mais que uma rivalidade clubística.
Como, aliás, muito bem explicou o antigo futebolista Luís Filipe em entrevista ontem publicada no zerozero e em que com a autoridade e o conhecimento de ter jogado no Vitória, no Braga, no Sporting e no Benfica e portanto ter estado em vários desses dérbis sabe bem o que eles são.
Mas amanhã é um novo jogo e portanto uma nova história para ser contada.
Ambas as equipas chegam ao dérbi numa fase reluzente das respectivas épocas em que tudo lhes está a correr de forma muito positiva.
O anfitrião Sporting de Braga no quarto lugar da Liga, mas próximo dos três primeiros, solidificando a ambição de uma vez mais se intrometer na luta entre os chamados “grandes” e continuando em prova na Taça de Portugal, estando presente na “final four” da taça da liga e disputando os oitavos de final da Liga Europa para onde caiu depois de uma presença digna na Liga dos Campeões onde se viu naturalmente impotente para ultrapassar os campeões de Espanha e Itália.
O Vitória em quinto lugar na Liga mas disputando o quarto, também neste jogo com o actual ocupante do mesmo, que é aquela posição que qualquer vitoriano conhecedor da História do clube tem sempre como objectivo mínimo e não máximo para qualquer temporada mas que nos últimos largos anos tem sido mais uma excepção que um hábito.
Continua na Taça de Portugal e com francas hipóteses de se apurar para os quartos de final, maiores que o seu grande rival mas será nos relvados que tudo isso terá de ser provado, enquanto na Liga Conferência foi eliminado por um mais que modesto Celje e na taça da liga caiu em casa aos pés do Tondela da II divisão dois insucessos que apesar de tudo não deslustram o bom campeonato ( e o percurso na Taça) que está a fazer especialmente considerando o facto de que já vai no terceiro treinador nesta época.
Reluz, pois, a trajectória das duas equipas na corrente temporada.
Mas para lá das duas equipas, que são a face mais visível dos dois clubes, há toda a restante realidade de um e de outro e que não estará totalmente em linha com a reluzente carreira das suas primeira equipas.
O Vitória arrasta consigo alguns problemas de curto e médio prazo, mas com influência a projectar-se no longo prazo, que não sendo bem resolvidos podem redundar num futuro que ningém quer.
Falhada a parceria com a Vsports e não se lobrigando no horizonte próximo qualquer alternativa a SAD mergulhou na habitual solução fácil de recorrer a empréstimos (este último a um juro que raia o absurdo) e à venda de jogadores, por vezes prematura e a bons preços para quem compra, como forma de compor um orçamento cronicamente deficitário naquilo que são “terapias” que aliviam os “sintomas” mas não curam a “doença”.
A par disso a equipa B, que tantos e tão bons jogadores forneceu à primeira equipa desdes 2012, vive mergulhada no abismo do Campeonato de Portugal ( uma quarta divisão onde jamais uma equipa do Vitória jogara) estando actualmente classificada no oitavo lugar (entre 14 equipas) com apenas um ponto de diferença para o primeiro lugar de descida e a catorze pontos do Amarante e oito do S.João de Ver que ocupam os dois primeiros lugares que são os que dão direito à disputa da fase de subida.
Para além de ser deprimente ver o Vitória nesta divisão e nesta posição classificativa é por demais evidente que só por imensa sorte jogadores que competem na IV divisão estarão à altura de a qualquer momento integrarem a primeira equipa que joga três divisões acima.
Em termos patrimoniais no clube nada de novo se construiu desde a presidência de António Pimenta Machado e mesmo a obra do mini estádio,que seria a primeira de fundo desde essa presidência, iniciada na presidência de Miguel Pinto Lisboa está parada desde a tomada de posse da actual direção com evidente prejuízo desportivo para a equipa B que nele teria o seu espaço natural de competição.
No Sporting de Braga a situação desportiva é a atrás referida e em termos patrimoniais o clube está numa fase de grande expansão com a inauguração da cidade desportiva e a conclusão próxima do seu mini estádio onde jogará a equipa B e o futebol feminino marcando assim uma diferença acentuada em relação ao seu rival vimaranense.
É pois estranho que quando tudo parece correr sobre rodas o Sporting de Braga tenha decidido agendar um assembleia geral com três pontos na ordem de trabalhos sendo que um é caricato, outro estranho e um outro polémico e todos eles, mas especialmente dois, contribuindo muito para um desinquietar da massa associativa e o aparecimento de divisões que nunca ajudam em nada.
Caricato é o que prevê situar a data da fundação do clube um mês depois daquela que sempre foi considerada não se percebendo qual a relevância do assunto para justificar a mudança.
É estranho pensar numa mudança de um emblema que existe há muitas décadas e cuja simbologia é perfeitamente pacífica na família braguista e no desporto português em geral.
E imagino bem o que seria em Guimarães se uma direcção do Vitória tivesse a peregrina ideia de mudar o emblema do clube.
O ponto mais polémico, mas que também não deixa de ser estranho, é a proposta de remover dos estatutos a obrigatoriedade de o clube deter sempre a maioria na respectiva SAD.
E é estranho porque em boa verdade o Sporting de Braga nunca foi maioritário na SAD pelo que esta proposta parece não ser mais do que adequar os estatutos a uma realidade que já existe.
Mas também é polémico porque dada a actual configuração da estrutura acionista da SAD ( Braga 36 %, QSI 29%, Fundo Sundown 17% e vários acionistas 16%) a remoção deste ponto parece indiciar que haverá a intenção de alguém,que não o Sporting Clube de Braga, tomar a maioria na SAD e querer fazê-lo sem violar os estatutos do clube para evitar eventuais contestações judiciais.
Ou até precisar de comprar acções ao clube para efetivar essa maioria sem que o clube possa ser acusado de estar ele mesmo a contribuir para a violação dos seus estatutos.
Sendo certo que no actual quadro societário tudo parece indicar que o pretendente a acionista possa ser a QSI.
O que significará, se assim for, que o Sporting de Braga passará a ser dirigido a partir de Paris e não dos escritorios da sua sede, como sempre aconteceu desde a sua fundação, o que trazendo vantagens desportivas imediatas e incontestáveis será também o irreversível adeus dos braguistas à propriedade seu clube e um futuro dependente de terceiros que apenas estão em Braga pelo negócio e sem qualquer afectividade à instituição.
E é por peceberem isso que muitos adeptos do Braga estão nas redes sociais, em tarjas espalhadas pela cidade e noutros espaços a contestarem a mudança dos estatutos e a traduzirem uma inquietude e até revolta associativa que o percurso desportivo não faria supôr e bem dispensava.
Em suma o dérbi de amanhã encontra duas equipas num momento reluzente que seja qual for o resultado do jogo não será obscurecido.
Mas nos dois clubes pode bem dizer-se que nem tudo que reluz é ouro!

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