Peixeirada
Depois Falamos.
Em Portugal
percebe-se que o campeonato está a entrar na sua fase decisiva em termos de
titulo não pela qualidade do futebol, pela emoção das jornadas, pelas
pontuações aproximadas entre candidatos mas pelo nível do ruído que dirigentes,
treinadores e paineleiros afectos vão fazendo dias após dia, semana após
semana.
Em suma é
pela “peixeirada” que se percebe que estamos no tempo das decisões.
E a
“peixeirada”, monotonamente, centra-se sempre em volta das questões da
arbitragem com os responsáveis dos clubes e os paineleiros televisivos que lhes
tão afectos a debaterem furiosamente, cada vez mais furiosamente, as actuações
e os eventuais erros dos trios de arbitragem sempre numa inamovível lógica de teorias
da conspiração que favorecem os outros e os deixam a eles de fora.
Sim, porque
a questão é mesmo essa.
Dos
responsáveis dos clubes aos paineleiros televisivos passando por alguns
supostos especialistas de arbitragem que opinam em jornais e não só a questão
fundamental não é darem tranquilidade aos árbitros para fazerem o seu trabalho,
nem lutarem para que o nível de polémica em volta da arbitragem diminua para
aquilo que é normal noutros países mas não em Portugal.
Não.
A única
preocupação que existe é que algum dos outros não seja mais beneficiado, mais
levado ao colo, mais favorecido pelo “sistema” do que o seu próprio clube.
Porque
quanto à verdade desportiva das competições a preocupação é zero.
E tudo que
podia contribuir para essa verdade desportiva, mas que mexa com os seus
absurdos privilégios, é algo que tem de ser ferozmente combatido porque a
preocupação primeira é ganhar pouco importando como se ganha ou o que se
atropela para poder ganhar.
É por isso,
precisamente por isso, que não se vê (nem nunca se viu) dirigentes de Benfica,
Porto e Sporting preocupados com questões tão elementares como a independência
dos árbitros, a negociação centralizada dos direitos televisivos (única medida
que permitiria dar algum equilíbrio aos campeonatos), a realização de sorteiros
do campeonato em pé de igualdade para todos, a alteração ao absurdo regulamento
da taça da Liga ou órgãos disciplinares fracos com os fortes e fortes com os
fracos.
Para eles
está bem assim.
Desde que a
falta de verdade desportiva das competições favoreça o seu primado, continue a
garantir que só três podem ser campeões, faça dos outros capachos dos seus
desejos e caprichos nada há a mudar e, pelo contrário, tudo deve ser mantido.
Desde que se
assegure o “pequeno” pormenor de que que cada um dos outros não é mais
favorecido que ele próprio.
E, de
preferência, até menos como é evidente.
Só isso
explica que neste país, com uma cultura desportiva pré-histórica, se gastem
centenas de hora semanais nas televisões a discutir Benfica, Porto e Sporting,
a polemizar arbitragens, a fazer de eleições num clube um assunto de interesse
nacional com inúmeros directos televisivos e notícias de telejornal, se
interrompa um directo com o Presidente da República a discursar para meter o
directo da conferência de imprensa do treinador do Benfica, se faça do futebol
desses três clubes assunto diário de telejornais e não sei quantos mais
programas.
É pela
simples razão de que num país em que se consome relativamente pouco peixe,
embora com a maior zona económica exclusiva (em termos de mar) de toda a União
Europeia, haja milhões que consomem avidamente a “peixeirada” de todos os dias.
Todos os
dias sem excepção!
Dir-me-ão os
leitores que todos os outros clubes podiam, e deviam, unir-se contra este
estado de coisas e exigir medidas de fundo porque SLB/FCP/SCP não jogam
sozinhos e se o “status quo” não fosse alterado havia sempre medidas de força,
incluindo suspensão dos campeonatos e taças, que podiam ser tomadas como factor
de pressão.
A exemplo
aliás do que se assistiu na vizinha Espanha em que Barcelona e Real Madrid
perante uma posição de força de todos os outros tiveram de aceitar sentarem-se
à mesa e negociarem questões de fundo como os direitos televisivos.
Mas Portugal
não é Espanha.
E os clubes
portugueses estão condicionados por três factores:
Um é falta
de coragem dos seus dirigentes para afrontarem os donos disto tudo.
Outra é o
facto de todos os clubes, ou quase, estarem condicionados pelo facto de
receberem jogadores emprestados e por isso não poderem incorrer no desagrado de
quem empresta.
A outra, que
remete para a tal cultura desportiva pré-histórica, é que na maioria dos clubes
os seus dirigentes tem uma “simpatiazinha” por Benfica, Porto ou Sporting o que
os leva por vezes a parecerem mais preocupados com os problemas do seu segundo
(quando não primeiro…) clube do que com aquele para que foram eleitos com a
missão de defenderem os seus interesses.
É triste mas é verdade.
E por isso a “peixeirada” continua, não passa de moda, retrata a (triste)
verdade do nosso futebol.
E dos nossos “peixeiros”…
P.S. Manda a verdade reconhecer que Rui Vitória e Nuno Espirito Santo têm
mantido os níveis de polémica dentro de limites perfeitamente aceitáveis. Nisso
são bem melhores que alguns dos seus dirigentes e paineleiros afectos. Honra
lhes seja feita.
A questão referida, de passagem, acerca dos empréstimos, é de importância fulcral nesta relação de poder.
ResponderEliminarAlém de criar subserviências dos clubes recetores em relação aos clubes fornecedores, a possibilidade de empréstimos provoca um certo "açambarcamento" de todo o jogador minimamente promissor.
Este açambarcamento é conveniente para os "grandes", porque lhes garante um quadro alargado de peças ao dispor, e é também conveniente para os "pequenos", porque lhes garante a disponibilização a preços muitas vezes gratuitos, de jogadores com potencial.
O mal é que, a médio prazo, acentuar-se-á a situação de poder dos "grandes", como acontecia na idade média, em que os "senhores" distribuíam as benesses e as migalhas a seu bel-prazer, ao conjunto dos servos e outros dependentes.
Julgo que o anterior presidente da liga tinha ideias bastante revolucionárias, em relação a estes temas de repartição de rendimentos. Por isso foi arrasado pelo establishement.
Caro luso:
ResponderEliminarGenericamente caracterizou bem a questão dos empréstimos.
Por mim eles nem deviam existir entre clubes que disputam o mesmo campeonato/taças porque viciam , de uma forma ou de outra, a verdade desportiva das competições.
Empréstimos sim mas de clubes estrangeiros.