Com o passar dos anos creio que se torna inevitável, com a justa dose
á sua medida para cada um de nós, não só recordar o passado como também dele
extrair lições cada vez mais valiosas em relação ao presente e aos tempos que
vão correndo.
Já noutros escritos tenho focado aquilo que me parece ser um cada vez
maior distanciamento das pessoas, e
muito em especial das mais jovens, em relação à política e às suas instituições
e muito particularmente em relação aos partidos políticos.
As razões são diversas, umas mais justas , outras menos justas e
outras totalmente injustas mas a verdade é que esse distanciamento existe e é
vulgar de Lineu ver os cidadãos responsabilizarem os partidos políticos por
tudo que de mau sucede no país criando uma cada vez maior linha divisória entre
os cidadãos e os agentes políticos.
E isso faz-me voltar a Abril de 1974
e recordar aqueles primeiros e exaltantes tempos de política em
Liberdade que a minha geração,então na zona etária da adolescência, viveu com
uma intensidade , um encantamento e uma militância que duvido que alguma vez
tenha sido possível repetir nas décadas seguintes.
E essas memórias reportam essencialmente a Guimarães, à juventude
vimaranense, a uma geração que andava então por idades entre os 14 e os 17 anos
e que era na sua quase totalidade completamente ignorante em relação à
política, às ideologias, aos partidos e à própria democracia.
É certo que já havia pelo Liceu de Guimarães, estabelecimento que
então frequentava, alguns colegas mais velhos, mais politizados, mais
interventivos dentro do quase inexistente espaço de intervenção e que pouco
depois do 25 de Abril (dias ou semanas) se veio a perceber pertencerem ou
estarem ligados a partidos que a ditadura obrigava a estarem na clandestinidade.
Falo obviamente de partidos como o PCP, com uma já muito longa vida
clandestina, ou de pequenos partidos de extrema esquerda surgidos de
dissidências do PCP como era o caso do MRPP por exemplo.
Mas esses colegas eram uma pequena excepção dentro de um universo
estudantil que na sua esmagadora maioria estava de facto completamente alheado
das questões políticas, que pela política não tinha qualquer interesse (em bom
rigor como podia ter num regime de partido único em que as “verdades oficiais”
eram lei?)e que nesse âmbito apenas se afloravam nalgumas conversas o tema das
guerras de África muito por força de um avançar das idades que começava a
tornar esse assunto um problema no nosso horizonte.
O 25 de Abril foi um franquear de portas até então hermeticamente
fechadas.
Com a Liberdade veio a Democracia e com esta os partidos políticos.
E se o PCP era um partido na verdadeira acepção do termo, com décadas
de existência e uma organização clandestina que lhe permitiu sobreviver à
ditadura, que tinha os seus orgãos dirigentes e uma longa experiência política
todos os outros começaram aí a dar os seus primeiros passos e a construir os
caminhos pelos quais pretendiam seguir.
Havia, é certo , os tais pequenos partidos de extrema esquerda mas sem
qualquer representatividade nacional e assentes em núcleos estudantis e operários
e existia um PS fundado na Alemanha mas que também ele pouco mais era do que um
grupo de amigos de Mário Soares cuja notoriedade internacional era bem maior do
que a do partido fundado em 1973.
Apareceram então o PPD, o CDS, a UDP, a LUAR (que já existia como
movimento com pretensões revolucionárias mas se viria a transformar em
partido), o PPM, o PDC e mais alguns de que a História não rezou nem reza.
Para nós jovens a despertar para a política, entusiasmados com os
tempos ímpares que se viviam e fascinados pela explosão de liberdade que o 25
de Abril trouxera tornou-se perfeitamente natural a adesão a um partido e o
mergulhar numa militância idealista a que nos sentíamos quase obrigados para
corresponder à generosidade dos capitães de Abril e assim servirmos a
democracia.
Nada percebendo de política, invadidos por um manancial de informação
quase atordoante que ia de programas partidários a manifestos ideológicos, a
opção natural de muitos foi aderirem a partidos mais por razões de influência
familiar nuns casos e dos grupos de amigos mais próximos noutros do que por
qualquer arreigada convicção ideológica que não podia naturalmente existir.
Claro que também existiram outras razões como a admiração criada pelos
lideres partidários nas suas aparições televisivas ( mas convém recordar que a
televisão,única, nada tinha a ver com a realidade televisiva actual),nas
entrevistas dadas a jornais e em várias outras razões que não valerá agora a
pena justificar.
E assim uns foram para o PCP (UEC e JCP) e para a extrema esquerda cujas máquinas de
captação de novos militantes estavam bem mais afinadas, outros para o PPD
(JSD), outros ainda para o CDS (JC) e alguns espalharam-se pelos pequenos
partidos então existentes.
Curiosamente no PS (JS) não houve adesões significativas e terá sido dos
grandes partidos aquele que, em Guimarães,teve mais dificuldade em fazer
arrancar a sua organização de juventude.
Uma vez filiados fazia-se militância a sério.
Colavam-se cartazes, pintavam-se paredes, montavam-se bancas nos
corredores do Liceu, faziam-se sessões de esclarecimento nos intervalos (que às
vezes acabaram de forma mais acalorada...), participava-se na organização dos
comícios, vendia-se nas ruas o “Povo Livre” (como perceberão falo agora apenas
da JSD), distribuía-se propaganda e viva-se o momento político com um fervor e
uma intensidade que nos trazia despertos para a política durante as 24 horas do
dia.
Fazia-se tudo isso com militância, com dedicação, pensando em ajudar o
colectivo e sem esperar nada em troca!
Era um tempo em que os partidos e as juventudes partidárias tinham o
respeito dos cidadãos.
Recordo esses tempos com saudade, certo de que não voltarão e mais
certo ainda de que o actual caminho trilhado pelos partidos e pelas suas
organizações de juventude também não contribui muito para que isso seja
possível.
Porque hoje vivemos num tempo de imediatismo.
Um tempo em que alguns querem tudo,sempre, ao mesmo tempo e quanto
mais depressa melhor.
Um tempo em que ainda não fizeram, não provaram, não construiram mas
já exigem, já reivindicam, já se acham credores deste mundo e do outro.
Um tempo de pressa excessiva.
Em que se queimam etapas, se atropela quem aparece no caminho, se quer
para amanhã o que nalguns casos nem daqui a vinte anos deviam ter.
Um tempo de “vale tudo”.
Desde que se consigam os lugares, as mordomias, os cargos e as
regalias.
Não sou, seguramente, daqueles que tem por hábito dizer “ dantes é que
era bom” como se os tempos não mudassem e as sociedades não evoluíssem.
Mas sou, certamente, dos que temem que por este caminho os “amanhãs
não cantem”.
P.S. Não quero puxar a brasa à minha sardinha. Mas registo com muita satisfação que a JSD de Guimarães tem sabido ao longo dos anos manter um espirito de intervenção política e de entrega ao partido que a fazem uma honrosa excepção ao que vai vendo por outros lados e por outras juventudes partidárias.
Caro Cirilo:
ResponderEliminarO que diz também é verdade para outras latitudes (a postura dos jovens da JSD em 74-...).
Não é verdade em Lisboa na actualidade -por isso o PSD teve 10,95%.
E mais não digo -está alguma coisa pelos jornais. Se tudo viesse a público era apenas em quantidade, não em qualidade.
Cara il:
ResponderEliminarSem qualquer dúvida.
E em muitos lados, quero acreditar, a JSD mantém-se fiel aos seus fundadores e aquilo que foi a sua norma de conduta nos tais anos iniciais.
Noutros, infelizmente, descambou para o que se sabe
E acerca disto:
ResponderEliminarSérgio Azevedo e Carlos Eduardo Reis, do PSD, são suspeitos na Operação Tutti Frutti
NELSON MORAIS
PJ investiga esquema no PSD para favorecer Santana
Vários elementos do grupo do PSD que é alvo da Operação Tutti Frutti são suspeitos de envolvimento num esquema de falsificação de fichas de inscrição de militantes, que era suposto ajudar Pedro Santana Lopes a conquistar a liderança do partido, nas eleições internas de 13 de janeiro último.
O objetivo não seria alcançado, pois foi Rui Rio quem obteve mais votos, mesmo que tenha justificado também pagamentos massivos de quotas a militantes, como suspeitam a Polícia Judiciária e o Ministério Púbico (MP), que estão na posse de indícios que apontam ainda para maroscas nas últimas eleições autárquicas e nas da Distrital do PSD/Lisboa.
Caro Carlos Silva:
ResponderEliminarAcerca disso investigue-se o que houver para investigar.
à política o que é da política e à Justiça o que é da Justiça