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sexta-feira, maio 11, 2018

Saber Ganhar

O meu artigo desta semana no zerozero.

Os jogos entre Vitória e Porto, os dois maiores clubes do norte de Portugal, tem larga tradição e inúmeras histórias para contar em volta das peripécias, dos resultados, das rivalidades e de outros temas que dão ao futebol aquele sabor único que ele possui.
Infelizmente o do próximo sábado, e bem ao contrário de tantos no passado, não terá nenhum outro interesse que não o de se esperar um bom jogo de futebol porque não conta para nada em termos classificativos dado que ambas as equipas tem o seu balanço final perfeitamente definido.
O Porto é, com toda a justiça, campeão nacional enquanto o Vitória terá uma classificação decepcionante a meio da tabela e , portanto, muito longe do que deve ser sempre o seu posicionamento num campeonato em que não pode ter ambição menos que ficar entre os quatro primeiros!
Daí o aproveitar esta crónica de hoje para duas reflexões.
Uma, curta, sobre a justiça na conquista do título pelo F.C. Porto e outra mais alargada sobre como é a postura dos “dragões” quando ganham troféus e a forma como se posicionam perante os seus adversários.
O Porto ganhou o campeonato com toda a justiça, já o disse atrás, porque foi a melhor equipa, a que melhor futebol jogou em grande parte da prova e aquela que melhor soube superar as adversidades próprias das provas de regularidade como o são os abaixamentos de forma e as lesões.
Creio que há um enorme mérito de Sérgio Conceição, que desta vez sim surpreendeu pela positiva, quer no fortíssimo espírito de equipa que implantou, quer na ambição que os seus jogadores puseram em campo, quer na forma como extraiu um enorme rendimento de jogadores em relação aos quais havia poucas expectativas de que Marega é seguramente o melhor exemplo porque foi apenas e só, na minha opinião é claro, o jogador mais decisivo deste campeonato.
Penso que o Porto começou a ganhar o título com o “bluff” de Agosto, espalhado aos sete ventos, de que por razões orçamentais não podia contratar jogadores e por isso apenas registava a entrada a custo zero do guarda redes Váná vindo do Feirense.
E era verdade.
Mas não era a verdade toda.
Porque discretamente o Porto fez regressar seis jogadores que tinha a rodar noutros clubes e esses seis jogadores, embora com niveis de participação diferentes, foram excelentes reforços para o plantel e seguramente bem melhores do que os reforços contratados pelos seus rivais.
Refiro-me ,como está bom de ver, a Marega, Aboubakar (os dois melhores marcadores da equipa com mais de vinte golos cada), Ricardo, Hernâni, Reyes e Sérgio Oliveira
E esses seis jogadores, a que em Janeiro se juntaria Gonçalo Paciência também regressado de um empréstimo, deram ao treinador um leque de soluções que se revelaria como decisivo na conquista do campeonato.
E se no ganhar não se põe em causa o mérito e a justiça já no saber ganhar há algumas coisas a dizer.
O futebol português vive de há muitos anos a esta parte uma macrocefalia asfixiante a que por comodismo se convencionou chamar os três "grandes" e que é composta por Benfica, Sporting e Porto.
Mas não foi sempre assim.
Em boa verdade, durante quatro décadas do século passado (do final dos anos 30 ao final dos anos 70) eram apenas dois clubes que disputavam a supremacia do desporto (não apenas futebol) português:
Benfica e Sporting.
Com domínio inicial do Sporting, décadas de 40 e 50 muito por força dos "5 violinos", que ao tempo seria o maior clube português mas depois tudo se transformaria com o momento decisivo que foi a chegada de Eusébio ao Benfica.
Que fez toda a diferença para os 15 anos seguintes.
Que foram de grandes vitórias do Benfica, com as duas taças dos campeões á cabeça, de grandes equipas e grandes exibições que trouxeram ao clube uma enorme legião de adeptos que lhe permitiu tornar-se no maior clube português.
E o Porto?
O Porto, que até tinha sido dos primeiros a ganhar títulos nacionais, vivia numa permanente subalternidade ganhando um campeonato de vez em quando e umas  taças de Portugal de quando em vez.
É então que, em 1976, se dá no Porto um facto de importância equivalente à chegada de Eusébio ao Benfica 16 anos antes.
Não através da contratação de qualquer jogador excepcional mas da tomada de poder interno por uma dupla histórica.
José Maria Pedroto e Jorge Nuno Pinto da Costa.
Um como treinador e o outro como director do departamento de futebol.
Os ideólogos do Porto actual mas também do "portismo" que a seguir definiremos.
O Porto actual conhece-se:
Um clube muitíssimo bem organizado, o clube com mais títulos nacionais do futebol português (campeonatos, taças e supertaças) e de longe o clube português com mais títulos internacionais em que avultam duas ligas dos campeões e duas taças UEFA .
A ideologia que permitiu tudo isso, lançada por Pedroto e Pinto da Costa e ainda hoje em vigor, é o "portismo".
Que se caracteriza basicamente por três premissas:
Criação de um inimigo externo, preferencialmente os clubes de Lisboa e a imprensa quase toda, que permita unir as "tropas" e motivá-las para a guerra.
Passagem da ideia que são todos contra o Porto e que a nível de poder futebolistico(e não só) há uma permanente conspiração contra o FCP.
O Porto é a bandeira do Norte em permanente luta contra o centralismo lisboeta e as suas instituições.
Com base nesta ideologia, e numa organização muito superior há de qualquer outro clube, o Porto vem de há quase 40 anos a esta parte a assumir-se como um clube hegemónico e a ganhar muito mais competições internas que qualquer outro.
Perguntar-se-á então porque é que a ganhar há quase 40 anos o Porto não é hoje o maior clube português em termos de adeptos quando ao Benfica, noutro contexto e noutro regime politico é verdade, bastou pouco mais de uma década para atingir esse estatuto.
A resposta não é simples mas vou tentar dá-la em cinco itens:
Em primeiro lugar o Porto não sabe ganhar com fair play e desportivismo.
Ganha com arrogância, com acinte, sempre minimizando o adversário e exaltando-se a ele próprio.
È uma postura agradável para os adeptos,odiosa para os adversários e desagradável para os indecisos que impede muita gente de aderir ao "portismo".
O Porto não sabe ganhar por si e para si; tem de ganhar sempre contra alguém!
Em segundo lugar , e claramente dentro da ideologia do "portismo", o Porto quando ganha não se limita a ganhar. Ganha contras as conspirações,contra Lisboa, contra a mais diversa espécie de inimigos nos quais inclui com todo o á vontade os clubes vizinhos renegando assim qualquer possibilidade de ser a tal "bandeira" do norte.
É um pouco a sindrome da pequena aldeia gaulesa de Astérix, rodeada de romanos (leia-se lisboetas) por todo o lado e em que a "poção mágica" é a união dos portistas contra o mundo exterior.
Infelizmente para o FCP esta visão do mundo é um resíduo do provincianismo que Pedroto tanto quis combater.
Em terceiro lugar manda a verdade que se diga que o "portismo" e o FCP nunca gozaram dos favores e fretes da imprensa nacional toda ela ,com raríssimas excepções, devotada à glorificação do Benfica e do "benfiquismo" e que tratou sempre o Porto como um clube menor.
E isso, nomeadamente em termos televisivos, faz diferença.
Em quarto lugar os métodos usados para ganhar.
Que muitas vezes não são agradáveis, algumas vezes não são conformes com a verdade desportiva, e indignam muita gente contra a forma como o Porto usa o poder de que dispõe nas instâncias do futebol.
Nada que outros não façam mas o Porto fá-lo com um descaramento despropositado e ainda exibe esse poder como um troféu de que se orgulha.
E isso afasta todos aqueles que acham que ganhar é bom mas não a qualquer preço.
Em quinto lugar o "portismo" tem um intrigante, mas bem vivo,complexo de inferioridade em relação ao Benfica que não tem reciprocidade por parte do clube de Lisboa.
E isso é patente nos cânticos das claques (que são o "portismo" no seu estado puro)contra o SLB mesmo quando o adversário em campo é outro clube qualquer como ainda aconteceu no jogo com o Feirense em que a certa altura lá vieram os cânticos insultuosos contra o Benfica.
Estar na festa do título, com o estádio completamente cheio, e em vez de viverem o momento da sua conquista estarem com o pensamento na perda do adversário é deprimente, é pequeno, é provinciano.
É profundamente irónico que a forma como o "portismo" festeja as vitórias sobre o Benfica dê ao adversário, com a dimensão desses festejos, o estatuto de importância que tanto lhe querem retirar.
O Futebol Clube do Porto é hoje o clube de maior sucesso no futebol português considerando os últimos quarenta anos.
Mais títulos nacionais, melhor organização, melhor curriculum internacional.
Mas não é o maior clube português, em termos de adeptos,  nem me parece que venha algum dia a sê-lo.
Porque o "portismo", afinal a ideologia que o fez começar a ganhar de forma consistente, ironicamente o limita a ele próprio fechando-o dentro de uma barricada que lhe limita o crescimento e cerceia a expansão para fora das "fronteiras" que ele próprio definiu.
Veremos se um dia a História não definirá o "portismo" como algo de essencial ao crescimento do FCP mas que acabou por se transformar no seu mais temível adversário.
Não sei se assim será.
Sei que um dos seus grandes ideólogos já morreu e o outro caminha para a reforma por força da lei da vida.
E o grande desafio para o futuro, nomeadamente o futuro pós Pinto da Costa, será saber se o Futebol Clube do Porto consegue libertar-se do "portismo" e encetar uma nova e diferente fase, igualmente ganhadora, da sua vida mais que centenária.

2 comentários:

  1. Caro Luis Cirilo.

    Cometeu um erro o Benfica te mais titulos nacionais do que Porto.
    Benfica tem 36 campeonatos 26 taças de Portugal 7 taças da liga 7 supertaças e 3 campeonatos de Portugal... fazendo as contas... 36+26+7+7+3= 79 títulos.
    Porto tem 28 campeonatos 16 taças de Portugal E 20 supertaças e 4 campeonatos de portugal... fazendo as contas 28+16+20+4=68 títulos.

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  2. Caro cards:
    Não ponho em causa os seus números nem me meto em contabilidades que ao que parece tem vários pontos de vista.
    Tive o cuidado de referir no texto que o Porto é o clube com mais titulos nacionais nos ultimos quarenta anos e quanto a isso não tenho a mínima duvida que estou certo.

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