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domingo, setembro 08, 2024

Pano para Mangas

O meu artigo desta semana no zerozero.pt
É uma frase feita, mas que faz todo o sentido, dizer-se que o futebol é a coisa mais importante das coisas menos importantes e por isso deve ser encarado na sua justa dimensão e não dar-lhe o carácter de assunto de vida ou de morte com que alguns, demasiados em boa verdade, gostam de o discutir no dia a dia e ultrapassando bastas vezes as fronteiras da racionalidade e da educação.
Naturalmente que num clube como o Vitória, em que tudo é vivido intensamente pelos adeptos, as entradas e muito em especial as saídas de jogadores de futebol (porque felizmente o clube também tem bastantes outras modalidades) da primeira equipa geram sempre acesa discussão entre os que acham que o clube está a vender mal ou muito mal e aqueles que entendem que as direções, sejam elas quais forem, fazem sempre tudo bem e portanto as críticas de quem discorda são de imediato elavadas à condição de terrível heresia quase se lamentando já não haver as fogueiras da Inquisição para queimar os herejes que se atrevem a discordar dos dogmas directivos!
É o que acontece , uma vez mais, com a transferência de Ricardo Mangas para o Spartak de Moscovo que gera enorme discussão entre adeptos quer pelo montante em causa, quer pelo excelente momento desportivo da equipa, quer pela impossibilidade de com o mercado fechado se contratar um substituto que não entre jogadores por alguma razão desempregados.
"Escaldados" pela terceira saída este ano civil por valores incompreensivelmente baixissimos (Jota Silva, André Silva e Ricardo Mangas), as duas últimas com o mercado já fechado, há muitos adeptos do Vitória que procuram perceber na sua plenitude que negócio é este e que vai o clube ganhar com ele em termos desportivos, financeiros e de imagem.
De imagem nada.
Fazer negócios com um clube de um país banido das competições desportivas internacionais como sanção á invasão da Ucrânia e alvo de inúmeras restrições comerciais por parte da União Europeia fica muito mal a um clube que se declara um "clube de Causas" e que até participou em momentos de solidariedade com a Ucrânia.
Ganhos desportivos é evidente que nenhuns.
Ricardo Mangas está a fazer um excelente início de época, é um dos jogadores mais decisivos da equipa, já leva quatro golos apontados nas competições europeias, está no radar de Roberto Martinez (embora isso valha o que vale...) e a continuar neste ritmo é óbvio que se ia valorizar na Liga Conferência e no próprio campeonato nacional.
A isto acresce que não pode ser substituido, a não ser por alguém do mercado de desempregados onde a escolha é muito escassa e qualitativamente duvidosa, porque foi transferido depois do dia 2 de Setembro.
Por tudo isso é inevitável que a equipa se ressinta desportivamente da sua ausência.
Resta a componente financeira que é aquela que em teoria explica a sua saída.
E tal como um dia disse o eng. António Guterres face a uns números difíceis de perceber ( é uma questão de fazer as contas...) aqui o fazer as contas talvez torne mais fácil de perceber toda a contestação aos valores desta transferência.
Um ano atrás o Vitória pagou ao Boavista um milhão de euros por Ricardo Mangas.
Um ano de salários mais as comissões desse negócio apontam para mais meio milhão de euros mais coisa menos coisa pelo que Mangas custou ao Vitória milhão e meio de euros.
Fazendo tábua completamente rasa da valorização do jogador neste ano o Vitória vende-o agora por dois milhões de euros ao Spartak de Moscovo.
Mais 500.000 € por objectivos de que falarei a seguir.
Desses dois milhões o Boavista tem direito a 400.000€, dado ter ficado com 20% do passe, e vão para o Fundo BDT&MSD mais 600.000 € dado ter direito a 30% do valor liquido das tranferências no mercado de verão consoante cláusulas do empréstimo que fez ao Vitória tal como aconteceu na transferência de Jota Silva.
E tal como escrevi nessa altura é verdade que essa verba abate ao passivo mas resulta de um negócio mal feito com a Vsports que obrigou ao recurso a esse Fundo que com outras cautelas não teria sido necessário.
A todas estas deduções ao valor recebido ainda é necessário juntar os valores de intermediação do negócio que seguramente não andarão abaixo dos 10% numa perspectiva optimista.
Em suma dos dois milhões entrará liquido nos cofre do clube um valor na ordem dos 700.000€ ou pouco mais do que isso.
O que atendendo ao investimento do Vitória em Mangas, aquisição mais salários, se constata que um jogador de 25 anos e em plena valorização desportiva deu prejuízo em termos financeiros.
Se não é caso único...parece.
Quanto aos objectivos e a fazer fé no que se lê nos diários desportivos , sempre pressurosos em publicar tudo que lhes é sugerido, eles serão de 500.000 € caso se cumpram duas premissas:
Uma é o Spartak ser campeão e a outra o jogador cumprir pelo menos 45 minutos em 50% dos jogos oficiais.
A segunda não parece difícil de cumprir mas já quanto á primeira convém recordar que o Spartak este século foi campeão apenas duas vezes, em 2001 e 2017, e que o Zenit de S. Petersburgo vai no sexto titulo consecutivo o que pressupõe clara hegemonia no futebol russo.
Há ainda uma percentagem de 15% sobre as mais valias de uma futura venda que me parece...utópica dado estarmos a falar de um jogador que acaba de abandonar um clube que está nas competições europeias, que é o grande palco para valorizar jogadores, para se ir meter num campeonato periférico de um país banido das competições internacionais não se percebendo como vai aí valorizar-se e gerar mais valias numa hipotética futura transferência.
Uma nota final para dizer o seguinte.
Tem sido aventado, seguramente que por inspiração de quem quer justificar este negócio de qualquer forma, que a saída de Mangas e o dinheiro encaixado permitem segurar outros jogadores e impedir que também eles saiam. Face aos números expostos é difícil de perceber como mas futuro relatório e contas da SAD certamente explicará. Ou não!
A outra "explicação" induzida na opinião pública é que foi o jogador a forçar a saída.
Essa é inaceitável.
Porque um jogador que tem um contrato em vigor , livremente assinado pelas partes, e com quem a entidade patronal esteja a cumprir normalmente as suas obrigações só tem uma forma de forçar a saída que é aparecer um clube que pague a claúsula de rescisão. Caso contrário tem de cumprir o contrato que assinou se o clube que representa não o quiser vender a preços de saldo.
Em suma tal como aconteceu com as saídas de André Silva e depois Jota Silva também esta transferência de Ricardo Mangas é assunto que provocou e vai continuar a provocar largo debate na massa associativa vitoriana porque é matéria que de facto tem pano para...Mangas!

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