O meu artigo desta semana no zerozero.
Todos sabemos por experiência própria, para o que bastará andarmos de olhos
abertos e ouvidos atentos, a importância que o futebol tem em Portugal desde há
muitos anos a esta parte.
Já em tempos idos institucionalizou-se a trilogia “Fátima , Fado
,Futebol” que muito jeito deu ao regime então vigente que sendo pouco amante
doutro tipo de discussões e debates nada
se incomodava que o povo concentrasse a devoção em Fátima, estivesse calado a
ouvir Fado e discutisse Futebol.
Foi até em nome desse importância que era estratégico o futebol ter
que um dia o governo de então terá “nacionalizado” Eusébio impedindo-o de se
transferir para Itália onde iria ganhar muito mais dinheiro e teria certamente
tido uma carreira de maior sucesso em termos internacionais.
Foi ainda nesse tempo que a imprensa, forçadamente obediente ao regime
por força do “lápis azul” e outras formas de persuasão, criou a mitologia dos
chamados “quatro grandes” (ao tempo os clubes- Benfica, Sporting, Porto e
Belenenses- que tinham sido campeões nacionais)que tinham uns privilégios muito
próprios como, por exemplo, o presidente da Federação Portuguesa de Futebol ter
obrigatoriamente que pertencer a Benfica, Sporting e Belenenses de forma
rotativa (aí até Porto ficava de fora)
que era uma forma de separar a “nobreza” do “povo”.
Andaram os tempos, mas não mudaram as vontades, e por isso em
democracia o lote dos chamados “grandes” ainda se reduziu (caiu o Belenenses e
o Boavista nunca nele foi admitido) e por isso a “nobreza” ficou restrita a
três clubes que tem hoje muito mais privilégios, muito mais poder, muito mais
vassalos e muito maior vassalagem do que tinham no tempo da ditadura do Estado
Novo.
Ao ponto de muitos, nos quais me incluo, considerarem que o 25 de Abri
nunca chegou ao futebol onde continua a vigorar a ditadura de três clubes sobre
os restantes.
Ou, mais suavemente, citando de forma adaptada George Orwell os clubes
são todos iguais mas há três que são mais iguais que os outros.
E é esse o ponto de situação do nosso futebol.
Um futebol em que a generalidade dos adeptos gosta dos seus clubes
muito mais do que gosta de futebol (isso nem seria completamente errado não
fora esse gosto exacerbado vir acompanhado em muitos casos de umas palas que
limitam seriamente a visão) o que leva a uma degenerescência de valores
preocupante que não só permite que se aceite o “vale tudo” desde que o clube
ganhe (ou, pior ainda, que se aceite o “vale tudo” como argumento legítimo para
ganhar) como leva milhões de portugueses a serem por este ou por aquele clube
só porque ganha mais vezes e não por laços de afecto e proximidade como seria
natural.
O futebol português, e muito do que o rodeia, envergonha hoje quem gosta
de futebol, quem defende a decência e acha a verdade desportiva um valor
primeiro de qualquer tipo de competição.
A arbitragem, incluindo o famigerado VAR que vinha para defender a
verdade desportiva e apenas serve para favorecer ainda mais quem já era
escandalosamente favorecido( alguém com dois dedos de testa acredita que os que
se “enganam” tantas vezes com o apito na boca iam passar a uma “seriedade” sem
limites sentados atrás dos ecrans de televisão e sem pressões de qualquer espécie
como as que existem nos estádios), está pelas ruas da amargura com sucessivas
actuações deploráveis das equipas de arbitragem no terreno e do VAR no conforto
da “cidade do futebol” sustentadas por alguns cartilheiros sem vergonha que
fazem dos leitores de jornais e dos telespectadores um bando de parvos
incapazes de ajuizarem por si só os
disparates cometidos na avaliação dos lances.
Quem viu o Vitória-Benfica, o Moreirense-Porto e o Benfica -Aves (para
só falar de exemplos recentissimos de
claros erros a favorecerem os em teoria mais fortes) e depois ouviu e leu os
cartilheiros perceberá bem de que falo.
Os clubes Benfica e Porto, únicos candidatos ao título e em teoria os mais
interessados em defenderem uma competição prestigiada e sem motivos de polémica,
envergonham o futebol todos os dias com constantes acusações mútuas, lançamento
de suspeições e casos, fazendo do futebol um caso de polícia e assim
desprestigiando todas as competições.
E como se já não bastasse o que atrás foi dito, desde o fanatismo
clubista de alguns adeptos aos erros das arbitragens, do tendenciosismo dos
comentadores/cartilheiros às polémicas alimentadas por dois clubes ainda temos
outras realidades que fazem do nosso futebol um futebol de terceiro mundo.
As polémicas “sanitárias” como as que afectaram o recente Vitória
FC-Sporting, as claques que se acham “um Estado dentro do estádio “ (as do
Sporting mas também as outras que actuam na maior das impunidades como as de
Benfica e Porto) , a facilidade com que se despedem treinadores sem que os
dirigentes alguma vez assumam a responsabilidade no eventual engano nas
escolhas, a forma como algumas televisões (então a Correio da Manha TV é
inenarrável nessa tarefa) ao mesmo tempo que promovem os três clubes tentam
humilhar e espezinhar os outros no tratamento depreciativo que lhes dão.
Já para não falar no problema dos problemas que é o facto de a
negociação dos direitos televisivos não ser devidamente centralizada, como na
generalidade dos país europeus onde o futebol é uma “indústria” séria e levada
a sério, e assim contribuindo para o artificial agravamento da desigualdade
entre uns e outros.
O nosso futebol é cada vez é cada vez menos um desporto e cada vez
mais uma doença social grave.
De cuja cura é de dia para dia, de jornada para jornada, de competição
para competição mais lícito duvidar!
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