No mundo fascinante do futebol poucas profissões se revelam tão
interessantes, mas também tão inseguras e tão variáveis nas avaliações que
sobre ela se fazem a cada momento, como a de treinador.
Se os grandes jogadores fazem o espectáculo, criam os lances geniais,
concebem as jogadas que perduram na memória e por isso ficam para a lenda do
futebol também é verdade que sem o trabalho dos treinadores tal não seria
possível porque sendo o futebol um desporto colectivo (com espaço para as
grandes individualizações é claro) são os homens que comandam a “máquina” que
tornam possível o maior espectáculo desportivo à face da Terra.
É uma profissão fascinante, sem sombra de dúvida, mas também a profissão
ligada ao futebol em que se passa mais depressa de bestial a besta, quantas
vezes nos escassos (para esse efeito) noventa minutos que dura um jogo, porque
o treinador é sempre o bode expiatório mais à mão para justificar resultados em
que bastas vezes é o menos responsável.
Nos mais de cem anos de competição que o futebol já leva é fácil
recordarmos os nomes de tantos e tantos jogadores que ficam para a lenda ,
desde os de categoria mundial cuja valia ultrapassa a fronteira de clubes e
países até aqueles que se destacaram no clube de cada um de nós e que ficam na
nossa memória clubística, mas já não é tão fácil recordarmos os nomes de
treinadores em igual quantidade porque pese embora a sua importância decisiva
no jogo não ficam tão ligados ao imediatismo do grande golo, da grande defesa,
do grande drible ou da grande jogada como os executantes propriamente ditos.
Aliás estando a História do futebol pejada de grandes treinadores,
desde pelo menos os anos 30 do século passado, são poucos aqueles que deixaram
uma marca mais decisiva no futebol que as grandes vitórias obtidas em clubes e
selecções.
E esses são os que para lá de ganharem troféus e títulos conseguirem
criar sistemas de jogo que perduraram para lá do tempo em que foram criados e constituíram
factores de inovação do próprio futebol.
Foram os casos de Herbert Chapman com o revolucionário “WM”, de
Helénio Herrera que aperfeiçoou até ao limite da eficácia o “catenaccio” de
Nereo Rocco, de Rinus Michels que criou o conceito de “futebol total” e foi escolhido
pela FIFA como melhor treinador de sempre fruto desse extraordinário modelo de
jogo e da dupla Cruyff/ Guardiola que inventaram o “tiki taka” que permitiu
extraordinárias vitórias ao Barcelona e é o último (até à data) grande e
revolucionário modelo de jogo.
Terá havido mais um ou outro mas são realmente muito poucos os
treinadores que além de ganharem os tais troféus e títulos também mereceram a “imortalidade”
futebolística pela sua criatividade em termos de conceitos de jogo.
César Luis Menotti, Arrigo Sachi, Fabio Capello, Alex Ferguson, Stefan
Kovacs, José Mourinho, Bob Paisley, Jurgen Klopp, Arsene Wenger, Bill Shankly, entre muitos
outros que poderia citar , foram e são treinadores de enorme sucesso pelo que
fizeram em clubes e selecções mas aos quais ninguém associa a criação de um dos
tais modelos de jogo que perdura para a História do futebol.
E por isso quando se fala dos grandes jogadores que integraram grandes
equipas, das grandes equipas que conquistaram troféus e títulos, dos troféus e
títulos que deram glória e palmarés a clubes e países é bom que fique sempre a justa
recordação de que nada disso seria possível sem os tais homens que exercem a
tal profissão tão fascinante quanto instável que é a profissão de treinador.
É oportuno recordar isto nestes tempos em que cada vez mais o
treinador é o elo mais fraco, em que cada vez mais frequentemente é o bode
expiatório dos erros dos presidentes e conselhos de administração das SAD, em
que ano após ano as “chicotadas psicológicas” parecem ser a única solução para
o mau planeamento das épocas ou até para a má sorte própria do jogo
propriamente dito.
Sem invalidar, como é óbvio, que sendo humano o treinador também
falha, também erra, também faz más leituras do jogo, também toma opções erradas
no decurso do mesmo
Quem viu, a título de exemplo , os recentes jogos do “meu” Vitória com
Standard de Liége e Vitória FC ou o Leipzig-Benfica terá identificado sem
qualquer dificuldade um conjunto de decisões erradas de Ivo Vieira e Bruno Lage
que estiveram na origem de as suas equipas não terem ganho jogos que estavam
perfeitamente ao seu alcance.
Que foram das leituras erradas dos jogos aos enormes erros nas
substituições que fizeram e nas que não fizeram.
Mas também por isso a profissão de treinador é tão fascinante (e tão
instável) , por permitir que sem jogar o treinador tenha tanta importância nas
vitórias, empates e derrotas como os jogadores.
E às vezes mais.
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