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segunda-feira, dezembro 09, 2019

Blocos

Dando de barato o quão aborrecido é falar sobre a política portuguesa do presente dividida que está entre as selfies presidenciais, a Greta do clima, os elefantes do Camboja ou a brutal incompetência da ministra da saúde (em bom rigor primeira entre pares) parece-me bem mais gratificante uma pequena reflexão sobre o que será Portugal, em termos politicos, daqui a cinco ou dez anos.
Tendo como ponto de partida da análise os partidos do presente mais do que o próprio, e anacrónico, sistema político em que assenta a democracia portuguesa.
Deixando  para já de lado os partidos mais jovens (Aliança, Chega, Iniciativa Liberal, Livre e Pan), não perdendo tempo com aqueles mais velhos ( MRPP, PPM, MPT, PNR, etc) que nunca foram a lado nenhum nem é nada provável que alguma vez cheguem a ir e não alinhando em brincadeiras como o RIR , PEV e outros do género.
Fiquemos-nos, pois, pelos clássicos.
E nestes, à parte o BE que é mais recente (embora feito da amalgama de partidos velhos), é comum considerar-se que PS, PSD, PCP e CDS são os partidos fundadores do regime democrático e aqueles que desde sempre tiveram representação parlamentar pelo que da respectiva evolução se fará muito desta análise.
Começando pelo CDS.
Cuja marcha para a irrelevância parece difícil de travar depois da catástrofe eleitoral, da demissão da líder e do desanimador "painel" de potenciais sucessores que se apresentarão a um congresso para o qual parece estar a ser difícil o recrutamento de delegados o que dá bem a imagem da crise que o partido atravessa e para a qual não se vê solução.
Depois o PCP.
Que perdeu deputados, que perdeu votos , que perdeu influência nas suas zonas tradicionais e que não conseguirá escapar a duas variáveis que sobre ele pendem com cada vez mais poder decisivo: O defenderem uma doutrina mais que centenária, ultrapassada pela História e pela dinâmica das sociedades, que por consoante tem um poder de atraccção cada vez menor para as novas gerações e o facto indesmentível de a sua tradicional base de apoio estar e envelhecer sem que a adesão de jovens compense de alguma forma essa lei da vida.
O PSD , que a par do PS tem alternado as lideranças de governo desde 1976, é um partido a sentir a erosão da sua base de apoio motivada pela dura governação a que foi obrigado entre 2011 e 2015 e também pelo facto de tendo os seus pontos altos de vitórias eleitorais alicerçados em lideranças carismáticas (Sá Carneiro, Cavaco Silva, Passos Coelho) e nos seus pontos baixos, quando remetido à oposição, resistindo com base na sua profunda implantação no Poder Local encontra-se agora numa fase em que não tem (nem se prevê que venha a ter) lideranças com carisma enquanto o seu poder autárquico tem vindo a diminuir de eleição para eleição.
Resta o PS.
Dos quatro fundadores do regime aquele que se moveu sempre por interesses e nunca por ideologia, que governa apoiado em quem lhe dá jeito a cada momento (bloco central, geringonça, coligação com o CDS, já provou de tudo), que com excepção de Mário Soares e durante algum tempo de José Sócrates nunca teve lideranças especialmente carismáticas, é ainda assim, e apesar desse inigualável jogo de cintura, um partido que o poder solidifica mas em que as linhas de fractura para o futuro já se vão descortinando com alguma facilidade entre os moderados "ao centro" que tem como expoente Francisco Assis e aqueles cujo sonho era serem do Bloco de Esquerda mas a quem a sedução do poder e das sinecuras inerentes mantém no PS como Pedro Nuno Santos, Ana Catarina Mendes ou o cada vez mais desvalorizado João Galamba.
Obviamente que quando um dia, que não será amanhã, o PS perder o poder essas linhas de fratura vão acentuar-se com consequências neste momento difíceis de prever.
Resta o BE, ainda de luto por não ter ido para o governo, mas que sendo a tal amalgama de partidos é fácil descortinar a cada insucesso o reavivar das tensões internas que no passado já deram origem a dissidências (de uma delas resultou o Livre ) e no futuro acabarão por pôr fim ao próprio partido como força política relevante  no xadrez partidário.
Concluindo esta análise ao presente será caso para dizer que o esgotamento do sistema político e eleitoral, as dinâmicas sociais que cada vez apela menos à militância e mais às causas, os erros que os partidos tem cometido e o próprio cansaço dos cidadãos face ao quadro partidário não auguram futuro auspicioso para nenhum destes partidos sendo de prever que nuns casos mergulhem na irrelevância sem retorno (CDS, PCP, BE) e noutros (PS e PSD) percam parte considerável da sua influência eleitoral ao ponto de ser impensável voltarmos a assistir a uma vitória por maioria absoluta de qualquer um desses partidos.
Significará isso uma oportunidade para os novos partidos? 
Sim e não.
Sim porque se souberem agarrar as causas importantes para os próximos anos ( crescimento económico, clima, coesão territorial, segurança, direitos humanos, regresso à agricultura, novas tecnologias, etc) e para as próximas gerações isso pode potenciar-lhes um espaço de crescimento que lhes permita serem parceiros de governo de quem ganhar eleições.
Não porque esse crescimento, mais provável à direita do que à esquerda porque a qualidade de vida das pessoas não se constrói com "banhos" tão ideológicos como utópicos, não será o suficiente para liderarem governos e substituírem os tradicionais PS e PSD nessas funções.
E então qual será o tal futuro a cinco ou, mais provavelmente, a dez anos?
Os partidos continuarão a existir (nem todos em boa verdade) mas as soluções de governo serão encontradas através de "blocos", digamos assim, que se construirão por afinidades de causas cujo sucesso na captação de eleitores definirão a cada eleição quem a vencerá.
Sendo certo que a disputa de eleições será entre blocos/coligações e não entre partidos isolados como na actualidade acontece.
Assim sendo creio provável a existência futura de quatro blocos políticos nos quais estarão muitos dos actuais partidos e, essencialmente, os eleitorados que na actualidade lhes dão a respectiva expressão eleitoral.
Um bloco de direita no qual estará boa parte do que restar do CDS, mais o Chega, e alguns pequenos partidos e cuja dimensão dependerá em boa parte da mobilização que conseguirem do mais que flutuante eleitorado de direita.
Um bloco liberal  no qual estará grande parte do PSD , algum CDS menos de direita, a Iniciativa Liberal , a Aliança e uma pequena parte do PS que não se reverá na deriva esquerdista que o partido vai conhecer no pós António Costa e que será um dos blocos que vai liderar governos.
Um bloco socialista composto pela maioria do PS, uma pequena parte do PSD que sonha com o Bloco Central de interesses , os dissidentes pela direita do BE e uma parte do Livre desiludida com o rumo dos acontecimentos. E este será o outro bloco liderante de governos.
E finalmente um bloco de esquerda do qual farão parte o actual BE (nem todo como já escrevi atrás), o Livre (igualmente nem todo) o PCP e mais alguns pequenos partidos de esquerda e de extrema esquerda que se associarão eleitoralmente a este bloco.
Marginalmente, na extrema direita e na extrema esquerda, poderão existir partidos que não se associem a blocos, partidos que serão de protesto mas que em bom rigor não contarão para nada em termos de governação.
Depois cada um destes blocos agarrará as suas causas e do confronto de ideias surgirão as soluções governativas consoante aquilo que os eleitores considerarem mais apelativo em cada momento
Daqui a dez anos se verá até que ponto esta previsão se confirma ou se, pelo contrário, nada ou quase do previsto veio a suceder.
Depois Falamos

P.S. Sem querer puxar a "brasa à sardinha" da Aliança vem a talhe de foice recordar que largos meses atrás o partido propôs a criação de uma grande coligação de partidos não socialistas que concorrendo juntos às legislativas as pudesse ganhar.
Era, de alguma forma, a antecipação deste futuro de blocos com o mérito político, e eleitoral, de ter sido pioneiro na percepção do futuro.
Os outros partidos não quiseram e por isso ficou o parco consolo de ter tido razão antes do tempo.
Que no caso era também ter razão a tempo!

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