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terça-feira, dezembro 02, 2014

Objectivamente

Ouvi falar pela primeira vez de Mário Soares logo a seguir ao 25 de Abril quando regressou do exílio em Paris (essa cidade tão querida dos socialistas portugueses...) e foi recebido em Santa Apolónia por uma enorme multidão.
Acompanhei e apreciei o seu percurso politico entre 1974 e 1976 quando se bateu com enorme coragem e persistência pela liberdade, pela democracia , pela construção de um Estado de Direito.
Recordo-me de ver na televisão os grandes comícios da Fonte Luminosa e lembro-me de uma ida dele a Guimarães, em 1975, em que do Toural à sede do PS (então na esquina das ruas Gil Vicente e Francisco Agra por cima de uma pequena pastelaria que ainda hoje existe) foi acompanhado por um cortejo de muitas centenas de pessoas a quem se dirigiu da varanda.
Depois começou a desilusão.
Com a forma como governou de 1976 a 1978 (ao ponto de o Presidente Eanes o ter "despedido"), como não deixou os governos de iniciativa presidencial governarem e com a postura que teve perante a constituição da AD.
Em 1980 qualquer vestígio de admiração restante dos anos de 74/75, que ainda pudesse existir,desapareceu pura e simplesmente quando Soares alinhou numa sórdida campanha de calúnias lançada pelo PCP  contra Francisco Sá Carneiro a propósito de uma suposta dívida ao...BES e da sua vida pessoal.
Percebi, logo aí, que o politiqueiro seria sempre superior ao estadista.
Fui dos que no PSD discordei da aliança de governo (Bloco Central) que Mota Pinto fez com Soares, depois de este ter ganho as legislativas antecipadas de 1983, porque não tinha a menor convicção das capacidades de Soares como governante nem sequer das possibilidades de o governo daí resultante ter êxito na governação.
Não teve.
E por isso quando Cavaco Silva, recém eleito líder do PSD, acabou com uma coligação podre e provocou eleições achei que para Portugal tinha sido a melhor solução.
Como foi de facto.
Apoiei Freitas do Amaral contra Mário Soares nas presidenciais de 1986 e as duas voltas dessa campanha, e os truques baixos usados pela candidatura de Soares como o da inventona do "Primeiro de Janeiro", apenas reforçaram o que na altura já era desprezo por um politico que não olhava a meios para atingir os seus fins.
Eleito presidente fez um primeiro mandato mais virados para os negócios e os amigos e menos para se opor aos governos de maioria do PSD.
Foi nesse tempo que surgiram os negócios da Emaudio, a subida na vida dos amigos Melancia, Rui Mateus e outros, os negócios de Macau nunca explicados e muito menos devidamente investigados por quem de direito.
No segundo mandato, para que foi reeleito com o apoio também do PSD, e dentro da leitura muito própria que faz da Constituição e das Leis da Repúblicas achando-se acima de todas elas como demonstrou sobejas vezes ao longo dos últimos anos, arvorou-se em líder da oposição ao governo e principal factor de instabilidade politica do país.
Dedicando-se, nos tempos livres, a infernizar a vida aos seus sucessores no PS!
Saído de Belém em 1996 refugiou-se numa Fundação com o seu nome, sita num edifício que lhe foi doado pelo filho enquanto presidente da câmara de Lisboa, e sustentada com escandalosos e vultuosos subsídios públicos quer da câmara de Lisboa quer dos governos do "profundamente amigo" José Sócrates.
Pelo caminho, além de cultivar amizades de gosto duvidoso como Bettino Craxi ou Yasser Arafat, encetou uma deriva ideológica à esquerda que o transformaria num quase ícone de sectores que anteriormente o tinham combatido com ferocidade e com os quais quisera sempre uma total separação de águas.
Percebeu-se então que Soares nunca seria um "senador" da República mas continuaria a ser um politico que não sabia viver sem a luz dos holofotes e uma exposição pública que lhe afagava o ego e lhe dava a pequena vingança de ser agora louvado pelos que tinham passado décadas a criticá-lo.
Foi candidato ao Parlamento Europeu, do qual quis ser Presidente e aceitou muito mal o não o ter conseguido com umas declarações completamente deselegantes que nem vale a pena recordar, mas nem o mandato terminou preferindo regressar a Portugal é às tricas de que tanto gosta da politica interna.
Em 2006, já com 81 anos, semanas depois de ter dito num jantar de aniversário perante centenas de pessoas que política "nunca mais" resolveu candidatar-se outra vez à presidência da República.
Resolvendo um problema a Sócrates (nada interessado em apoiar dessa vez a candidatura de Manuel Alegre) mas sem perceber que o seu tempo tinha definitivamente passado e que o resultado dessa aventura só podia ser o que foi.
Uma derrota clamorosa ás mãos do odiado Cavaco Silva ficando num humilhante terceiro lugar atrás de Manuel Alegre que protagonizara uma candidatura independente.
De lá para cá é o que se sabe. 
Entrevistas patéticas, momentos televisivos penosos, "Aulas Magnas" em que funciona  como "atestado" de bom comportamento democrático de muitos que nunca quiseram nada com a democracia, a negação do que defendera durante décadas, a aproximação aos que sempre tinha combatido.
A rábula à porta do Estabelecimento Prisional de Évora foi apenas mais um capitulo, degradante, da perda de faculdades intelectuais e físicas de um pobre velho que a família não sabe defender de momentos que ele não merecia, apesar de tudo, passar.
Objectivamente o cidadão Mário Soares podia ficar na memória dos portugueses como um vulto que num determinado espaço temporal teve um papel importantíssimo na instauração e consolidação da democracia e que depois nesta ocupou os seus mais altos cargos.
Com a aprovação de uns e a rejeição de outros como é normal nos regimes democráticos.
Infelizmente, para ele e de certa forma também para a História, acabará por ser recordado por estes últimos desgraçados anos em que por responsabilidade inicial própria e depois falta de protecção familiar se transformou numa penosa caricatura de si próprio e motivo de riso generalizado face à forma como intervém publicamente.
Não havia necessidade.
Depois Falamos.

8 comentários:

  1. É oficial: o Dr. (?) Cirilo tem a maior dor de cotovelo de todos os tempos.
    Será impossível em tempos vindouros ver tanto ressabiamento num só post.
    Terá sido do seu agrado a votação final daquele programa dos grandes portugueses em que ganhou o Dr. Oliveira Salazar. Mas olhe que a votação foi forçada sabe?
    Aquilo direitinho ganhava D. Afonso Henriques número 1 e Mario Soares como o mIor português vivo !

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  2. Caro LC
    A sua azia em relação a MS é notória, dado o número de vezes em que escreve sobre ele depreciativamente.
    Se calhar o homem, até pela idade que tem, merecia outro distanciamento

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  3. Sic Gloria Transit Mundi9:09 da manhã

    já para não falar nas tristes declarações depois da morte de Eusébio, em que o chamou de bebado!

    Há gente que não sabe mesmo quando deve retirar-se...

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  4. Caro Anónimo:
    Quando o dedo aponta para a lua os idiotas olham para o dedo.
    Caro luso:
    Quem anda à chuva molha-se. E esse personagem devia, ele sim, distanciar-se da politica corrente. Como não o faz sujeita-se à critica.
    Caro Sic:
    É o caso desta penosa personagem

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  5. Quem conheceu o pai de Mário Soares- o Padre João Soares- afirma que este terá dito: «...o meu filho não tem coluna vertebral». Pela 1ª vez concordo com alguém do clã Soares...

    Realmente o homem só se tornou democrata, depois de levar do PCP. Antes eram todos "compagnons de route".
    E o desprezo pela lei, pelo povo que ele tem?

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  6. Caro Il, o pai de Mário Soares, oficialmente é João Soares. No entanto, o seu verdadeiro pai é o Mariano Felgueiras.

    Cumprimentos,
    Rui

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  7. Cara il:
    Há gente com memória muito curta.
    E a este senhor parece que, para alguns, tudo lhe deve ser permitido. A História se encarregará de o por no seu lugar.

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  8. Caro Rui:
    Já ouvi isso várias vezes. Mas para o caso a paternidade não é o mais relevante.

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