Serão todos merecidos e provavelmente pecarão por escassos!
Direi apenas que na minha modesta opinião foi um Homem cuja grandeza ultrapassou fronteiras politicas,raciais,religiosas e se tornou numa personalidade de consenso para toda a gente,em todo o lado, fruto do seu exemplo de vida.
Quem depois de uma vida de sofrimento(27 anos preso) e de luta contra terríveis injustiças foi capaz de se constituir num exemplo de perdão e de união entre todos os sul africanos e dar um contributo fundamental para uma transição pacifica do apartheid para a democracia é por direito próprio alguém que alcançou a imortalidade e enfileira no restrito lote daqueles que como dizia Luís de Camões " ...se foram por obras valorosas da lei da morte libertando..."!
Este Homem notável, que tornou melhor o tempo em que todos vivemos, merece uma ultima homenagem e seguramente aquela que ele mais apreciaria.
Que depois dos discursos e das homenagens saibam seguir o seu Exemplo.
De tolerância, de paz, de fraternidade, de perdão, de rejeição da vingança e da violência.
Depois Falamos
A primeira vez que senti o frio glacial do racismo nas palavras e no olhar dum ser humano, foi na Cidade do Cabo, em Julho de 1956, quando desembarquei do paquete" Pátria", durante uma escala de duas horas, rumo a Moçambique, onde ia em viagem comercial como viajante da firma Pimenta Machado.
ResponderEliminarO táxi que aluguei para me levar ao centro, foi obrigado a parar por um policia da circulação, que com palavras ríspidas me intimou de sair. " Dont'you know that "that" is a black driver? , apontando com desprezo para o motorista! Apartheid ! Black only!
Sai e fui a pé!
Muitos anos passaram e um dia passei a viver noutro pais, onde vivo agora. Voltei como responsável comercial à África do Sul . Nomeei um agente em Joanesburgo. Fui seu convidado várias vezes para jantar em casa dele, numa casa, no meio de dois hectares de jardim. 15 quartos! Falava o afrikaans e inglês. Convidei-o também a vir a minha casa, em França. Conheci-o bem. Era um ferrenho adepto do Apartheid! Racista impenitente. Na casa dele, à mesa, havia sempre um empregado de pé, negro, por trás de mim, ao meu serviço. A dona da casa, à cabeceira da mesa, tinha uma campainha para chamar os serviçais, os escravos. Não pronunciava o nome deles.
Um dia , durante uma visita da firma que eu dirigia, viu alguns empregados negros em frente de máquinas automáticas de alto nível tecnológico. Não compreendia que eu tivesse empregasse gente de cor em trabalhos desses. Expliquei-lhe que nos testes que passavam obrigatoriamente cada vez que havia uma vaga, só a qualidade profissional contava. E que quando eram melhores que os brancos, não havia hesitação. Mas isso, ele não compreendia. Tanto mais que eram quase sempre franceses, filhos do antigo império! Da Martinica ou do Senegal.
Um dia, na casa dele, falamos do futuro da África do Sul. E do vizinho Português de Moçambique. Não conhecia o meu passado. Perguntou-me como eu via esse futuro? Estávamos em 1970. Respondi-lhe francamente que um dia o povo Negro havia de recuperar, para melhor ou para pior, a independência. Inelutavelmente, esse povo tomaria consciência dos seus direitos, seria cada vez mais bem informado desses direitos, e o numero em relação aos brancos, acabaria por pesar na balança. E que o mundo exterior também pesaria na solução.
Respondeu-me : " Enquanto tivermos aqui ao lado a maior base militar aérea da África, esse dia nunca chegará". Enganou-se estrondosamente. Um homem branco seria um dia aliado de Mandela : Frederik Willem de Klerk. Os dois evitaram talvez o maior banho de sangue potencial da história da África.
Durante muito tempo, Mandela ficou anónimo. Nos anos 80, a maioria dos Europeus não conhecia o seu nome. O seu combate contra o apartheid não interessava os poderosos deste mundo. Madame Thatcher , que recebeu o carrasco do povo chileno, Pinochet, qualificava Mandela de "terrorista"".
Nelson Mandela era um personagem pouco recomendável para a direita europeia. Aqueles que não fizeram nada para a libertação de Mandela e mantinham excelentes relações com o regime racista de Pretoria, celebraram entretanto à maneira dos "people" aquele que simbolizava um combate que eles nunca compartilharam. Nelson Mandela não tinha ilusões sobre a hipocrisia de muita gente célebre que lhe faziam visitas. Ele aceitava este ritual discretamente, dizendo : " E preciso passar por ali para o bem do nosso povo".
Os mesmos vão chorar lágrimas de crocodilo agora, porque Mandela é incontornável : Ele foi a mais bela lição de humanidade da Historia. Adeus Madiba !
Caro Amigo, escrevi o comentário precedente sobre Mandela no Facebook, para alargar o diálogo. Espero que não veja nenhum inconveniente nisso. Se me permite, gostaria de acrescentar este comentário à margem do mesmo, no seu blogue.
ResponderEliminarA homenagem planetária a Nelson Mandela não deve fazer esquecer que aquilo pelo qual este Grande Homem lutou, isto é, os valores de dignidade e respeito da pessoa humana, não se circunscreviam ao povo da África do Sul só, mas era antes uma mensagem destinada a todos os homens.
Mandela era um Grande Homem. Um Homem de convicção e de coragem que soube libertar o seu pais. E que soube deixar o poder no momento oportuno. Mas curiosamente, hoje, muitos dos seus correligionários lamentam que ele não tivesse continuando mais algum tempo na direcção do pais.
A razão é que as palavras que ele pronunciou, ainda estão presentes na memória dos seus compatriotas e que muitos consideram que o objectivo ainda não foi atingido. Estas palavras foram: " O meu ideal mais caro foi o duma sociedade livre e democrática na qual todos viveriam em harmonia com possibilidades iguais de sucesso. Este é um ideal pelo qual estou pronto a morrer".
A libertação de Mandela em 11 de Fevereiro de 1990 não foi um presente, mas foi sim, pela força das coisas, imposta ao poder racista da África do Sul por este Ocidente que tinha apoiado durante dezenas de anos o poder. Este Ocidente que compreendeu que o vento da história tinha virado e que era melhor negociar com o ANC que de perder tudo numa guerra civil sangrenta. Não esquecer que até 2008, o ANC e Nelson Mandela estavam na lista negra dos Estados Unidos como "terroristas".
Quando De Klerk foi visitar Mandela na ilha de Ruben Island, incógnito, entrou pela garagem para não ser visto. Li as memórias de De Klerk. Ficou impressionado pela calma, a cortesia e a confiança em si mesmo demonstrada por Mandela. De Klerk desejava apressar o movimento de libertação. Ele sabia que o seu partido político se encontrava do mau lado da História. O muro de Berlim tinha caído. O governo do apartheid não podia continuar a opor-se ao ANC de Mandela para "parar a expansão comunista" ! O argumento estava falido! Em 2 de Fevereiro De Klerk anunciava a libertação de Mandela. No dia 11, Mandela iniciou a sua longa marcha para a liberdade.
O após Mandela ainda comporta muitos perigos. O imperialismo colonial continua presente apesar da descolonização. A situação não é tão rosa como se pensa. O problema da distribuição das terras não foi tratado. Provavelmente, parcialmente, porque a reconciliação foi prioritária. Conceito nobre, em si mesmo, mas a justiça não se ocupou das violências institucionais contra os Negros .
Fundiram os dois hinos , o Nkosi Sikelete Afrika, hino africano da esperança, com o Die Stem (que ouvi algumas vezes), um hino célebre da revolta boer de Slagtersnek de 1816, para fazer o hino nacional. Muitos não o querem cantar, pelo menos na integralidade
As feridas ainda estão escancaradas. A miséria é imensa, o desemprego insuportável, sobretudo para os jovens negros, a violência é omnipresente. As feridas infligidas pelo regime racista restam vivas e difíceis a tratar. Façamos votos que a União persista após Mandela.
Em definitivo, o que é que se pode reter da legenda Mandela? Ele honrou a África e a Humanidade. Não existem personagens que tenham marcado mais a sua época no XX° século como o Mahatma Gandhi ou o seu herdeiro espiritual Nelson Mandela. Talvez estes dois exemplos nos permitam de ter esperança na condição humana.
Freitas Pereira
R.I.P. Madiba.
ResponderEliminarCaro Freitas Pereira:
ResponderEliminarDificilmente se ilustraria melhor a importância de Nelson Mandela do que através dos comentários que aqui deixou fruto da experiência própria e das leituras que fez sobre a matéria.
Ainda não li as memória de De Klerk mas já estão na lista.
Caro Francisco:
Sem duvida. Bem merece