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quinta-feira, agosto 26, 2010

Este é o maior fracasso da democracia portuguesa


Não tenho muito por hábito transcrever artigos na integra.
Mas este, da Clara Ferreira Alves, merece-o.
Magnifico.
E intemporal.
Depois Falamos

Não admira que num país assim emerjam cavalgaduras, que chegam ao topo, dizendo ter formação, que nunca adquiriram, (Olá! camaradas Sócrates...Olá! Armando Vara...), que usem dinheiros públicos (fortunas escandalosas) para se promoverem pessoalmente face a um público acrítico, burro e embrutecido.
Este é um país em que a Câmara Municipal de Lisboa, em governação socialista, distribui casas de RENDA ECONÓMICA - mas não de construção económica - aos seus altos funcionários e jornalistas, em que estes últimos, em atitude de gratidão, passaram a esconder as verdadeiras notícias e passaram a "prostituir-se" na sua dignidade profissional, a troco de participar nos roubos de dinheiros públicos, destinados a gente carenciada, mas mais honesta que estes bandalhos.
Em dado momento a actividade do jornalismo constituiu-se como O VERDADEIRO PODER. Só pela sua acção se sabia a verdade sobre os podres forjados pelos políticos e pelo poder judicial. Agora continua a ser o VERDADEIRO PODER mas senta-se à mesa dos corruptos e com eles partilha os despojos, rapando os ossos ao esqueleto deste povo burro e embrutecido.
Para garantir que vai continuar burro o grande "cavallia" (que em português significa cavalgadura) desferiu o golpe de morte ao ensino público e coroou a acção com a criação das Novas Oportunidades.
Gente assim mal formada vai aceitar tudo, e o país será o pátio de recreio dos mafiosos.
A justiça portuguesa não é apenas cega. É surda, muda, coxa e marreca.
Portugal tem um défice de responsabilidade civil, criminal e moral muito maior do que o seu défice financeiro, e nenhum português se preocupa com isso, apesar de pagar os custos da morosidade, do secretismo, do encobrimento, do compadrio e da corrupção.
Os portugueses, na sua infinita e pacata desordem existencial, acham tudo "normal" e encolhem os ombros.
Por uma vez gostava que em Portugal alguma coisa tivesse um fim, ponto final, assunto arrumado.
Não se fala mais nisso. Vivemos no país mais inconclusivo do mundo, em permanente agitação sobre tudo e sem concluir nada.
Desde os Templários e as obras de Santa Engrácia, que se sabe que, nada acaba em Portugal, nada é levado às últimas consequências, nada é definitivo e tudo é improvisado, temporário, desenrascado.
Da morte de Francisco Sá Carneiro e do eterno mistério que a rodeia, foi crime, não foi crime, ao desaparecimento de Madeleine McCann ou ao caso Casa Pia, sabemos de antemão que nunca saberemos o fim destas histórias, nem o que verdadeiramente se passou, nem quem são os criminosos ou quantos crimes houve.
Tudo a que temos direito são informações caídas a conta-gotas, pedaços de enigma, peças do quebra-cabeças. E habituamo-nos a prescindir de apurar a verdade porque intimamente achamos que não saber o final da história é uma coisa normal em Portugal, e que este é um país onde as coisas importantes são "abafadas", como se vivêssemos ainda em ditadura.
E os novos códigos Penal e de Processo Penal em nada vão mudar este estado de coisas. Apesar dos jornais e das televisões, dos blogs, dos computadores e da Internet, apesar de termos acesso em tempo real ao maior número de notícias de sempre, continuamos sem saber nada, e esperando nunca vir a saber com toda a naturalidade.
Do caso Portucale à Operação Furacão, da compra dos submarinos às escutas ao primeiro-ministro, do caso da Universidade Independente ao caso da Universidade Moderna, do Futebol Clube do Porto ao Sport Lisboa Benfica, da corrupção dos árbitros à corrupção dos autarcas, de Fátima Felgueiras a Isaltino Morais, da Braga Parques ao grande empresário Bibi, das queixas tardias de Catalina Pestana às de João Cravinho, há por aí alguém que acredite que algum destes secretos arquivos e seus possíveis e alegados, muitos alegados crimes, acabem por ser investigados, julgados e devidamente punidos?
Vale e Azevedo pagou por todos?
Quem se lembra dos doentes infectados por acidente e negligência do Ministério da Saúde Leonor Beleza com o vírus da sida?
Quem se lembra do miúdo electrocutado no semáforo e do outro afogado num parque aquático?
Quem se lembra das crianças assassinadas na Madeira e do mistério dos crimes imputados ao padre Frederico?
Quem se lembra que um dos raros condenados em Portugal, o mesmo padre Frederico, acabou a passear no Calçadão de Copacabana?
Quem se lembra do autarca alentejano queimado no seu carro e cuja cabeça foi roubada do Instituto de Medicina Legal?
Em todos estes casos, e muitos outros, menos falados e tão sombrios e enrodilhados como estes, a verdade a que tivemos direito foi nenhuma.
No caso McCann, cujos desenvolvimentos vão do escabroso ao incrível, alguém acredita que se venha a descobrir o corpo da criança ou a condenar alguém?
As últimas notícias dizem que Gerry McCann não seria pai biológico da criança, contribuindo para a confusão desta investigação em que a Polícia espalha rumores e indícios que não têm substância.
E a miúda desaparecida em Figueira? O que lhe aconteceu? E todas as crianças desaparecida antes delas, quem as procurou?
E o processo do Parque, onde tantos clientes buscavam prostitutos, alguns menores, onde tanta gente "importante" estava envolvida, o que aconteceu? Alguns até arranjaram cargos em organismos da UE.
Arranjou-se um bode expiatório, foi o que aconteceu.
E as famosas fotografias de Teresa Costa Macedo? Aquelas em que ela reconheceu imensa gente "importante", jogadores de futebol, milionários, políticos, onde estão? Foram destruídas? Quem as destruiu e porquê?
E os crimes de evasão fiscal de Artur Albarran mais os negócios escuros do grupo Carlyle do senhor Carlucci em Portugal, onde é que isso pára?
O mesmo grupo Carlyle onde labora o ex-ministro Martins da Cruz, apeado por causa de um pequeno crime sem importância, o da cunha para a sua filha.
E aquele médico do Hospital de Santa Maria, suspeito de ter assassinado doentes por negligência? Exerce medicina?
E os que sobram e todos os dias vão praticando os seus crimes de colarinho branco sabendo que a justiça portuguesa não é apenas cega, é surda, muda, coxa e marreca.
Passado o prazo da intriga e do sensacionalismo, todos estes casos são arquivados nas gavetas das nossas consciências e condenados ao esquecimento.
Ninguém quer saber a verdade.
Ou, pelo menos, tentar saber a verdade.
Nunca saberemos a verdade sobre o caso Casa Pia, nem saberemos quem eram as redes e os "senhores importantes" que abusaram, abusam e abusarão de crianças em Portugal, sejam rapazes ou raparigas, visto que os abusos sobre meninas ficaram sempre na sombra.
Existe em Portugal uma camada subterrânea de segredos e injustiças, de protecções e lavagens, de corporações e famílias, de eminências e reputações, de dinheiros e negociações que impede a escavação da verdade.
Este é o maior fracasso da democracia portuguesa.

Clara Ferreira Alves - "Expresso"

5 comentários:

  1. Realmente inacreditável...

    Luís R.

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  2. Caro Luis R:
    Inacreditável sim.
    Mas,infelizmente,verdadeiro.
    E então aquela parte relativa á "compra" de jornalistas é comprovável todos os dias.

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  3. Caro Luis Cirilo,

    Começo por referir que é triste quando, em democracia, se tem de omitir a identidade sob pena de graves consequências apenas por emitir uma opinião diversa.

    Daí que ainda esteja aqui, de quando em quando espreitando talvez o que não devesse comentar por força das consequências.

    Mas não resisto!

    Nós, no geral, somos até um "Povo Porreiro". Quanto mais mal nos fazem mais gostamos deles.

    Meu Pai me dizia, em tempos não muito distantes, "quando o burro tem fome, albarda-se o bicho!".

    Aqui o "Povo" toma um pouco a posição do "Burro" que é alimentado de fachada e de favores, onde tudo vale para permanecer no conforto dos gabinetes gerindo mal o que é de todos.

    E continuamos todos a assobiar para o ar como se nada fosse connosco.

    E a maior prova disso mesmo, são as sucessivas vitórias eleitorais, em que ninguém vota a favor de uma corrente, mas inezplicávelmente, essa corrente acaba por vencer, convencer e reforçar!!!

    É deveras interessante como o "Burro" permanece quietinho enquanto se alimenta!

    Muito interessante!

    E mais não posso comentar, ou não quero!!!

    Um abraço e...

    JG

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  4. Que deploremos ou que nos resignemos , a democracia é frequentemente apercebida como o reino da mediocridade. O comum seria o médio. O poder do povo seria o poder da massa... Ora a massa não pensa. Ela é nivelante, inculta e ávida de possessões materiais.
    Tocqueville tinha avisado que a paixão da igualdade, para quem definia os costumes democráticos, podia resultar na uniformização dos caracteres, na homogeneização das condutas e das vontades e no conformismo.
    Pensar por si mesmo ou afastar-se das normas admitidas daria como resultado um perigo que ninguém correria, devido ao peso do numero que seria grande.
    E quando digo ninguém, penso, claro está, naqueles que têm interesse que esta situação perdure. Qualquer que seja a tendência ideológica , nunca os vi fazer esforços reais para que o povo “não seja burro”, como escreve "Anonimo".

    E, em tempos de crise económica e também social, que destrui as relações sociais, dissolve o espirito cívico, (se ele existia!) aumenta a incivilidade e o desprezo do outro, cada vez mais separados uns dos outros pelo seu egocentrismo e o seu desejo de possuir, os homens só são permeáveis às grandes maquinarias dos discursos, dos produtos, das imagens ou da ideologia que cada um pode apropriar-se sem ter que discutir, ou raciocinar, sem ter necessidade de consultar alguém, de contactar alguém e de partilhar uma experiência qualquer.

    Transformado em poder de massa, o poder do povo cai em si mesmo, interioriza-se, individualista e uniforme, alheio ao bem comum e ao interesse colectivo.

    Assim, o povo não pode governar. Outros governam em seu nome, em proveito próprio , temos de admitir!

    Aquela Democracia sonhada, que protege, o mais igualmente possível, o desenvolvimento da individualidade de cada um, cedeu o lugar à Democracia que nivela, conforma e que liberta... a sociedade. Mas a que preço ? Voilà la question!

    A corrupção ,a todos os níveis, incluindo o da justiça, é o resultado do “desvio” da democracia e do conjunto das instituições , por aqueles que detêm o verdadeiro poder : o económico.

    Ora sem instituições verdadeiramente democráticas, um povo não pode ser realmente um povo. E não tem nenhuma “chance” de escapar à tal situação de “burro”!

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  5. Caro JG:
    De facto é verdade que trinta e seis anos depois do 25 de Abril de 74 continua a haver medo neste país.
    Medo de ser contra o poder,de ser contra o sistema, de afrontar quem manda.
    E esse medo existe na politica,no futebol,na função publica e em muitos outros lados.
    Como também é verdade que passada a eleição é dificil encontrar alguém que tenha votado em quem ganhou.
    Uma coisa é certa: "eles " estão lá porque de algum lado os votos vieram.
    OXalá da próxima sejam esses votos a tirá-los de lá.
    Caro Freitas Pereira:
    Tem,como sempre,imensa razão.
    A Democracia,em sentido lato,foi para ai mesmo que evoluiu.
    O cidadão em nome do materialismo (nem que seja do mais fútil dos bens), da ânsia de te ro que os outros tem ou ainda não tem,despiu-se da exigência critica e da razão no sentido mais abrangente do termo.
    Ou seja,tornou-se permeável á mais comum demagogia,ao discurso inflamado,aos que tem a capacidade de prometer o paraíso na terra!
    E depois,como no seu egocentrismo exacerbado odeia admitir que se enganou,persiste no erro.
    Não porque se ache bem governado mas apenas porque não quer admitir que as suas escolhas foram imperfeitas.
    Tal como no futebol a sua equipa é sempre a melhor.
    Mesmo quando não joga nada,perde desafios atrás de desafiso,e ameaça descer de divisão.
    E isto é válido desde uma junta de freguesia á presidência de um grande país.
    Erros são erros.
    Persistir neles é manter os "burros" bem alimentados, como diz o o JG, e ser burro
    sem aspas.

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